Tải bản đầy đủ (.pdf) (74 trang)

Brasil delivery

Bạn đang xem bản rút gọn của tài liệu. Xem và tải ngay bản đầy đủ của tài liệu tại đây (7.36 MB, 74 trang )

../o

Cop)'rigln Copyrigh. desta ediỗóo (;l Boircmpc Editorial. !OOS

lvana Jinkings

Editara

Vlvian Miwa Marsushira

Ana Paula Casrellani
Joóo Alexandre Pesch3nski

Mareei lha

Raquel S,lbberry Brióo

Guilherme Xavier

l.uciana Soares da Silva

Bibiana Leme

alitor;,,1

Coordmafiio rdilon"f

AlSISlmu

RnJilf;D



PrrplITa(iiO

ỳspa
l'rodufiớo

Diagrama(iớo

CIPãBRASIL. CATALOGAầOãNA.FONTE
SINDICATO NACIONAL DOS eDITORES DE LIVROS . RJ

P349b

I. Tớtulo. 11. S.:nr.

Paulani, Leda, 1954Brasil Delivery : servidóo fioanceira e estado de emergờncia
econụmico I l.eda Mana !':lulan;, . Sóo Paul" : Boieempo, 2008.

Inclui bibliografia

(Emou de sớrio)

~\..,rno 200]ã.

CDD: 3.l8 .981
t:DU: 338.2(81)

I. Brasilã PulớliQ econụmica, 2. Brasil Condiỗừes econ ụmicas.

ISBN 978-85-7559-115-4


.t Brasilã Polhio e
08ã1168.

011 reproduzida

sema Cllpt= aurorizaỗõo da editora,

Todos os direitos reservados . Nenhuma parte adia obra podcró

se. utilizada

I' ediỗóo. maio de 2008

BOlTEMPO EDITORIAL
rii?;:':~-=;.;....,-=.:.r.=:...:...:;::=::::::....".q:ingsEditores Associados Lida .
' ud idcs Je Andrnde. 27 Perdizes
05030ã030 510 Paulo SP
~~~----1f--...:::.:;;.;:::...::::...:::;ỗ,oL.t2x: (11) 386..,ã6947 I 3872-6869

r.:::;::,::::::=-:~+=;=:::.;;=:::::.:==:t,'WW.boitcmpordilorớal
.com.br

Ap~S(lI'afiio

SlãM"\H\O

:

Bra.sil Daim)': razừes, contradiỗừes e limites da polỹica


econụmica nos primeiros seis meses do governo Lula

internacional (um balanỗo da polớrica econụmica

o Brasil como pbt:lrorma de valorizaỗõo financeira
do primeiro ano do governo Lula)

7

15

35

53

147

141

.. 105

73

Đỗm esperanỗa de ser paớs:
.;{governo Lula. dezoito meses depois

_

67


t:

.:8 ~-.:emo Lula' (alternativa ao neoliberalớsrno!
,

~ ~~imemos e servidóo financeira:
j'~.:Jhasil do ỳltimo quarto de sộculo

~ ;..~: .; ~

-

;

i:q~rojeto neoliberal para a sociedade brasileira:
' . c seus -Impass('$ .1.:. ~:di
"" ;. n:-:ỗ t ; '

~ ~." :

_

.':~ P~fuais polỹico dos temas econụmicos:
~[~;~;~ de posfỏcio
ã:~'J,.ã~'iT.~~
/j'Jhio
.c:
..~J'"


'~f_ã.f.i;~, .

:~::~.:;.~~~

. "I

.t~;;~ft.

)1;~~
.".
:...


!!

I-i) - - -

,

~'.

~

.i
......
>.ti

:\ PRESE:"T:\<':,\O


É

Em outubro de 2002, Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito presidente do Brasil. Menino migranre, vindo do Nordeste pobre para o Sudeste
.# co no emblemático "pau-de-arara", torna-se, como muitos outros de
idêntica trajetória, operário do centro industrial do país. Carismático
.~ ,de fala fácil, transforma-se naturalmente em líder operário, reconhe. 9.do pelas greves em massa que consegue organizar durante o período
$.tatorial. Essa quadratura histórica acaba empurrando a jovem lide~~ça para a lida política e daí para a fundação de um partido de opo,'~i~o ao regime militar, Dados sua origem operária e o momento em
~.V~ se constitui, o Partido dos Trabalhadores (P'T) torna-se rápida~iij:§~te, e malgrado as intenções de seu idealizador, referência e abrigo
~:p~ a esquerda de todo o país. assim, pois, embalado no acaso his:r' ~· · ·;- -,;
((


:·;itq,~.co , que nasce, quase sem querer, o maior partido de esquerda do
t~~do" , como o PT chegou a ser conhecido. O desacerto que os 21 anos
~~i;litadura militar provocaram na sociedade civil, moendo sua capaf.J~~~de de organização e de resistência, fizeram do PT a grande legenda
5.~&ual. findo o governo autoritário, praticamente todo o pensamento
~~~~ista passou a depositar suas esperanças.
t.~.%~~e grande equívoco, urdido pelas artimanhas ~~ História, desfez~~iffl~ a ascensão de Lula e do PT ao governo federal. Alcançado o

J"'" 1'(:' :~, maior, o presidente Lula e seu partido adotaram a mais conser:
. <~~· das políticas econômicas conservadoras já experimentadas pelo
'~~
9filJ;Longe.de ser ~~~ violação de seus mais ~r~s princípios, adota-

.::: :.~

a optar entre resistir a um curso

s-


que já estava em marcha e

;;:.~ o natural a ser seguido e foi conscientemente escolhida. Pres-

~i,,~~~,total lmposslblhdade de uma conduta distinta, ela se mostrou

-

.'

. -r,

"

..

.: "

:.~:

:~'{~il'


.

B • Brasil Dfliflfry

havia colocado o país numa armadilha - ou permanecer nesse caminho, o partido e seu líder maior não riverarn nenhuma dúvida: dando
Vaz30 ao conservadorismo que jazia logo abaixo da aparência contestadora trajada ao longo de mais de duas décadas (c que lhes rendera a
vitória nas eleições), escolheram a continuidade.

Dado o inusitado da situação, podemos dizer, parafraseando Marxo qual assimse expressou em relação às crises monetáriasque de quando em quando se abatem sobre o capitalismo-, que ao susto teórico (e
hisrórico) aliou-se o pânico prático, pois, vindo de quem vinha, era
evidente que essa escolha implicava o abandono da perspectiva do desenvolvimento, a desistência do alcance de uma soberania que ainda
estava por ser construída e a total entrega do país a interesses alheios
aos da imensa maioria de sua população. Esse pânico prático, é evidente, não acometeu a rodos indistintamente - tomou de assalto, em
especial, aqueles que estiveram envolvidos intelectual e politicamente
com a construção daquela suposta opção. Sendo esse o caso da autora
destas linhas, tornou-se inevitável a busca de explicações e de uma
maior compreensão sobre o que estava de fato se passando.
A origem deste livro deve muito a essa procura de informações, de
interpretação histórica, de aprimoramento do diagnóstico. Escritos entre
março de 2003 e novembro de 200S (com exceção do posfácio, elaborado em novembro de 2007, a partir de artigo redigido em fevereiro de
2007), os artigosaqui reunidos procuraram, a cada momento, dar coma
da situação criada com a eleiçãode Lula e com as escolhas feitas por ele
para governar o país. Mas, como o trabalho intelectual é altamente
socializado, estecompêndio não existiria se, mesmo com o susto hisrórico, o pânico prático e a profunda indignação, não houvesse também
um forte estímulo intelectuale demandas de origem váriaque me instaram a pôr no papel e, portanto, a organizar tudo aquilo que vinha
atabalhoadamente percebendo e considerando.
Assim, minha divida maior é com Paulo Arantes, que, desde nossas
primeirasconversas depois da ascensão de Lula, convocava-me a escrever as observações que lhe fazia, em especial aquelas sobre a política
econômica do novo governo. Essaconvocação tomou a forma concreta de um convire para escrever um pequeno artigo para a revista Reportagem - excelente publicação mensal paulistana dirigida pelo jornalista
Raimundo Rodrigues Pereira e na qual Paulo Arantes organizava um
caderno especial de opinião. Um convire para participar de um semi~_ -':.

Apresentação' 9

~~ ..: . ivas de nosso desenvolvimento, e convidou-me a participar

.j;jf.as e ideológicas as mais variadas sobre o governo de Lula e as


-,0-~~ :~ """,,:,<

nária em Belo Horizonte, em abril de 2003, organizado pelos professoresJoão Antonio de Paula e Marco Aurélio Crocco, havia me obrigado a minimamente organizar, para preparar a intervenção ~u~ ~i
faria, meus argumentos a respeito do caráter do governo que se iruciava, Tendo aceitado o convite de Raimundo e Paulo, retomei aquelas
idéias e produzi o artigo encomendado. Ao escrevê-lo deparei com a
expressão que cncima este livro e que me pareceu, e ainda me parece.
resumir com inequívocaclarezao resultado mais nefasto da opção pela
continuidade que Lula e o PT patrocinaram. É mister lembrar que foi
um prócer do primeiro escalão desse governo quem afirmou ser delivery
a palavra da moda, O que fiz foi juntar numa expressão única, contraditória por definição,asduas metadesdesseprojeto nacional inconcluso
chamado Brasil.
. Mas "Brasil Delivery" não era propriamente um artigo acadêmico,
dado o veículo para o qual havia sido escrito. O professorJoão Anronio de Paulaentra novamente em cena, com a proposta de transformar
em livro os calorosos debates ocorridos no seminário de Belo Horizonte, Alongueientão o artiguete que já existia,aprofundei-lhe as considerações de natureza mais teóricae terminei assim, em julho de 2003,
·:(;i,artigo que abre a coletânea.
j:;~. No início de 2004, findo o primeiro ano do governo de Lula- com
~t~tados desastrosos no que se refere a crescimento econômico e gez~~o de emprego -, urgia a necessidade de aprofundar a discussão e
·:~ªrnecê-la de considerações teóricas mais robustas. Um convite para
~~frever um artigo para a revistaalemã Prokla, uma amiga dívida com
'~1?eriódico brasileiro Critica Marxista e a quarta edição do seminário
, ;~Macx internacional", que ocorreria em Paris em setembro daquele
f > .. __ .;...
~~:§:9.) combinaram-se para formar conjuntamente o álibi de que eu neJ~~tava para pôr em marcha esseprojeto. É nesse segundo ~rti?o que
.if~-m.~ a tomar forma aquilo que já estava em germe no pnmelro , ou
. ;&'~~l%t"?- tese de que o Brasil vem se transformando a passoslargos numa
;~P.YitMorma de valorização financeira internacional.
}';f~~ agosto de 2004 mais uma demanda, dessa vez formulada pelo
;T.~~!8~or João Sicsü, permitiu-me prolongar a reflexão. Sicsú organi~ri:~~~tão um livro no qual planejava justapor leituras econômicas,
p~;-::-'- '


;"t~l,'!me. Sob o pretexto de realizar um balanço do primeiro ano e
f~·~~,


~~. (

...

;'I

\,

I
.

,

I.

11

I"

:1

10 Brasil Oaivay

meio desse governo, regresso aos argumentos anteriores, tomo de emprộstimo uma instigante tese de Paulo Arantes, aprofundo a questóo
teúrica da dớvida pỳblica e de seu papel na valorizaỗóo financeira, e
estỏ pronto o terceiro artigo.

Entrementes eu tocava tambộm, alộm da atividade acadờmica usual,
a presidờncia da Sociedade Brasileira de Economia Polớtica (SEP), entidade qual me filiei desde seu inớcio em 1996 e da qual fui diretora (l996~ 1998) e vice-presidente (I998-2000). Eleita em junho de
2004 para gerir a entidade no biờnio 2004-2006, destaquei em minha
proposta de trabalho a necessidade de que a SEr, sem descuidar de seu
papel acadờmico de fortalecer o pensamento heterodoxo vis--vis a dura
investida da ortodoxia, aprofundasse seu papei polớtico. Uma das medidas concretas que [Ornei com esse intuito, junto com a diretoria que
comigo se elegeu, foi inscrever a SEP na quinra ediỗóo do Fúrum Social
Mundial, que ocorreria em Porto Alegre, em janeiro de 2005. Entre as
atividades que ali propusemos e realizamos houve uma mesa sobre a
questóo dos novos governos latino-americanos (particularmente o de
Lula no Brasil, O de Kirchner na Argentina e o de Tabarộ no Uruguai)
e sobre atộ que ponto eles poderiam ser considerados alternativas ao
neoliberalismo no continente. Particularmente no caso do Brasil, o
aprofundamento dessa discussóo mostrava-se de fundamental impor.
tõncia, dada a equivocada interpretaỗóo corrente, mesmo entre inrelectuais de esquerda, de que Lula fazia O enfrenrarnenro que era possớvel
doutrina e aos interesses dominantes, rendendo-se a eles apenas quando nóo havia outra alternativa. Era essa, portanto, a oportunidade que
faltava para colocar no papel a rese de que o governo Lula nóo sú nóo
constituớa alternativa, em qualquer aspecto considerado, ao neoliberalismo, como era sua mais completa encarnaỗóo.
Foi ai que comecei a juntar duas ỏreas de discussóo nas quais vinha
militando hỏ algum tempo, quais sejam: a anỏlise do desenvolvimento
capitalista no Brasil, de um lado, e a histúria do neoliberalismo como
doutrina e coleỗóo de prỏticas de polớtica econụmica, de outro. O quarto
artigo ộ o resultado primeiro dessa junỗóo e da organizaỗóo dessa discussóo. Seu resultado mais bem acabado estỏ no ỳltimo artigo (o sexto), escrito. dessa vez, por encomenda da Escola Politộcnica de Saỳde
Joaquim Venõncio. entidade pertencente Fundaỗóo Oswaldo Cruz.
Em comemoraỗóo aos vinte anos de existờncia da escola, seus gestores
houveram por bem realizar um seminỏrio em que se discutisse nóo sú

da Revista da Sociedade Brasileira de Economia Polớtica.

Apresentaỗóo I 1


educaỗóo, nóo sú formaỗóo de profissionais para atuar na saỳde pỹblica, mas tambộm o pano de fundo em que essa atividade se ãdesenvolve.
Convidaram-me, entóo, por volta de julho de 2005, a escrever um
artigo , que deveria estar prontO ao fim de outubro, sobre a dinõmica e
os impasses do ncoliberalismo no Brasil. Nóo poderia haver melhor
oportunidade para aprofundar a discussóo que eu iniciara na intervenỗõo feita no V Fúrum Social Mundial e que foi publicada no nỳmero 16

_~.

Tive aớ tarn bộm a oportunidade de dar maior curso a outra tese que
jỏ havia delineado anteriormente. Mais uma vez instada por Paulo
Arantes, fiz uma intervenỗóo, numa atividade promovida pela revista
Margem Esq/lerda, na mesma quinta ediỗóo do Fúrum Social Mundial,
a fim de mostrar que Lula fazia uso de um instrumento singular para
levar adiante sua polớtica hiperconservadora: a decretaỗóo de um estado de emergờncia econụmico. A idộia, entóo apenas esboỗada. enconrrou no artigo escrito para a Escola Politộcnica a oportunidade de se
desenvolver.
Mas, antes disso, uma nova solicitaỗóo do professor Joóo Antonio
de Paula revelou-se providencial. Preparando, em abril de 2005, uma
ãuQY'a ediỗóo do seminỏrio ocorrido em Belo Horizonte dois anos ant~ie1e me convidou a escrever sobre a questóo dos investimentos no
..
.
. .
.
~~. Atulhada de compromiSSOS, como sempre, aceitei a ernpreua~1inas propus ao professor Chriscy Pato, amigo, interlocutor e secre;~ da SEP, que se associasse a mim nesse projeto. Estimulada pelo
_~;~a que me havia sido encomendado e pelo enquadramento geral do
~io, denominado agora "A economia polớtica do desenvolvimen/~J!(o anterior denominara-se "A economia polớtica da mudanỗa"),
-i;~'~.~ei um pouco o foco do momento corrente para pensar o curso
tt~_ _comecimencos num escopo temporal mais largo. Jỏ que a tese da
.~~~~~~o do Brasil como plataforma de valorizaỗóo financeira interna,:~~~P estava na minha cabeỗa, pensei de imediato numa primeira se~~ig:ue colocasse lado a lado mais de meio sộculo de informaỗừes
?""-;<-., ~~~ formaỗóo bruta de capital fixo e sobre as despesas com rendas

~;:~anỗa de serviỗos do balanỗo brasileiro de pagamentos. Intuớ tarn,~
(jue seria necessỏrio repensar a questóo da "dependờncia", que em
-::,".pio caracterizaria ainda nosso processo de desenvolvimento. O
"~:pr Chriscy, hỏbil em nỳmeros e computadores e competente no
Hleoria da dependờncia (defendera em 2004, no Departamento


t2 • Brasil DdilJ
menta: fi opção do governo Lula.

de Ciência Política da FFLCH/USP, brilhante dissertação de mestrado
sobre a matéria), era o sócio ideal para levar adiante tais pretensões.
Trabalhando juntos, compilamos informações para confirmar a tese
da plataforma de valorização financeira, ousamos propor a troca do
termo "dependência" pelo termo "servidão" (no caso, servidão financeira) e, como subproduto, numa analogia à descoberta anterior de
Caio Prado, deparamos com o sentido da industrialização no Brasil.
Esse. portamo, é o conteúdo do quinto artigo, o qual foi publicado no
livro organizado pelo professor João Antonio de Paula, com as contribuições do seminário, e que veio a público em outubro de 2005. Contudo, contrariamente ao esperado, o volume não trouxe como rítulo o
nome do evento que lhe deu origem (liA economia política do desenvolvimento"), mas o expressivo, e sintomático, Adeus ao desenuoluiFoi mais uma vez Paulo Arantes, que tenho o privilégio de ter como
leitor, quem considerou que esses artigos rodos que vim escrevendo
desde a posse de Lula em janeiro de 2003 poderiam ser publicados
conjuntamente, num único volume. Ponderou que sua publicação na
coleção Estado de SItio, por ele dirigida na Boiternpo, viria a calhar.
Assim, em meados de 2006, teve início a edição do volume que agora
vem a público. Nesse meio rempo Lula se reelegeu, a economia mundial tornou-se ainda mais ambígua - crescendo de modo sistemático
como não crescia há pelo menos trinta anos, mas ao mesmo tempo
sendo assombrada pelo fantasma de uma crise financeira a ser detonada pelo mercado imobiliário norte-americano - e a economia brasileira experimentou um crescimento menos tímido que, no encanrovern
nada alterou o diagnóstico anteriormente feito. Em razão disso, um
posfácio tornou-se necessário; este foi elaborado tomando por base

um artigo escrito com o professor Rodrigo Alves Teixeira a propósito
do lançamento do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) e publicado na Folha de SPaulo em 10 de fevereiro de 2007 .
A generosidade da editora Autêntica, da editora Manole, da Escola
Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, da CrItica Marxista e da Revista tÚ1 SEP. que permitiram a republicaçâo dos textos, rornou possíve1 a concretização da idéia de reuni-los todos. A despeito do caráter
conjuntural de muitas das observações aqui encontradas, o que predomina são as proposições de caráter estrutural. Por essa razão, e também
porque as considerações empurradas pela conjuntura dão conta das

evitar repetições.

Apresentação' 13

São Paulo, dezembro de 2007

circunstâncias em que os artigos foram escritos, eles foram aqui
republícados tal como se encontram em suas edições originais. As diferenças eventualmente encontradas devem-se a cortes efetuados para

~ .

:.. '"- .


"/

r.

i

' I

jj


jl
i,il

:t:",
:;

01

I'
JI

IIL
i!
::j
"

"

:I'
ili

~ t;

!!
"

i ::

\


I !

BRASIL DEL/IDfr
razões. contradições e limites, da política econômica
nos primeiros seis meses do governo Lula

11.

Carta Capital de 25/6/2003)

"José Dirceu pronunciou um discurso
que nem o Pedro Malan faria..."
(Olavo Setúbal, presidente do Conselho de
Administração do ltaú, em entrevista

1. A morte da macroeconomia

Desde seu início. em janeiro de 2003, o governo Lula vem praticando uma política econômica de inclinação inequivocamente liberal,
confirmando o que muitos esperavam, alguns com angústia. outros
,tom alívio, Teses e argumentos incansavelmente defendidos ao longo
' a os oitos anos de governo Fernando Henrique Cardoso (FHC), sempJ:e criticados pelo Partido dos Trabaihadores, são age ta afirmados pelo
'g~~no deste último com desconcertante naturalidade.
:_;1fM.t~reditam alguns que a gestão Lula será ainda mais liberal que a de
:j~~~r~ntecesso r, pois conseguirá levar a cabo uma série de transforma{;~ com as quais FHC apenas sonhou. Angcli, em charge na Folha de
,~~~~Jo de 26 de abril de 2003, traduz à perfeição essa expecrariva:
~~sre~ando sobre o retrato presidencial, o primeiro indivíduo toma
~:;~~:por um sósia de FHC; o segundo, em dúvida, argumenta que
, .'l<.•, .:s.rj}.,~~)~ mais gordinho"; ao que e terceiro retruca: "que nada , este é o
*~§~'yerdadeiro" .

'1?-f.~~~W~da que não seja uma completa surpresa - para alguns, essa mano.~~'i~\~~ca1 já estava em germe no início de 2002 e, para OUtros, antes
'~Ili~~~~~disso -, o cenário impõe reflexão: quais as rnzões de tamanha
i-;~=f;~
}~qu ais os limites dessa políricai ,
-'. }hecemos pelas razões, A primeira alegada razão é sobejamente
cJ4a. Mesmo o mais distraído observador da cena nacional a
! )lont a da língua. Trata-se da famosa "Tina" (" There is no
. )~~"). na qual estivemos submersos nos últimos oito anos e da
!#tos acreditaram que sairíamos, ou, ao menos, ergueríamos
,~ a cabeça.
~. ;

~~Jft_

.

~ ~ ·:~~t,~

,; .• • : : ..- .
-l
. : . ~-~ - .~

.,('~7~

.

-"


.!


i:

i
I

i

I,

~ ,

: i

]!

<-

I (j


Brasil Dtlivuy

o primeiro elo da cadeia argumcntariva que Sustenta a força da
TIna ~ o de que existe só uma macroeconomia. Repetido hoje de A a Z,
ou seja, por economistas das mais variadas filiações ideológicas, o argumento reza q~e não há política econômica de direita, de esquerda
ou de centro. Existe a política cerra, tecnicamente (sic) fundamentada
neutr~; c existe a política errada, irresponsável, utópica, ingênua:
p~pUIIS[a. Por,tanto, todo e qualquer ajuste só pode se dar na esfera
rnicroeconômica: o spreadbandrio é alro? - mexa-se na Lei de Falências; a renda é mal distribu ída! - basta "focar" os programas sociais e

aumentar sua eficiência; e assim por diante. São intocáveis o ajuste
fiscal "duro", o juro real elevado, a polüica monetária conrracionista o
câmbio flutuante, a livre movimentação dos capitais.
'
Portamo, se só há uma política macroeconômica cientificamente
~mp~vada, um governo responsável, qualquer que seja sua filiação
Ideológ~ca, deverá ,adotá-la. O matiz ideológico fica assim relegado à
condução de políticas de enfoque microeconômico: mais ativamente
"pró-social" para os governos de esquerda (políticas compensatórias
erc.), menos preocupadas com o "social" para os de direita I,
Não é demais lembrar que essa poltrica macroeconômica, considerada,a única correta porque a única verdadeiramente científica, implica,
partlcularm~nte no caso de economias como a brasileira, a extinção do
espaço em SI da política econômica: a polüica monetária fica atrelada
às metas inflacionárias; a fiscal, aos superãvirs, e a cambial é comanda.
da pelo pró~rio mercado. Nesse contexto, aliás, não há rigorosamente
nenhuma diferença entre a independência do Banco Central e sua "autonomia operacional" ,

I

Não é preciso dizer o quanto há de ideológico nessa forma de colocar as coisas.
Reconhecer a existência do "problema do social" - expressão que vem se consagrando nos últimos anos - implica tomar espuriamente o todo como se fOS5e só
Uma parte. e certamente não a mais importante, da questão nacional. Evidente~e~te essa expressão c OUtras que lhe são correlatas não estão desvinculadas da
idéia de que 56 há uma macrocconomia. Pelo contrário, das reafirmam a tese de
que a economia. macroc:eonomicameme falando. deve ser trarada pelos governos
-s:paradamenl<:M do "restante" dos problemas. O conteúdo desse discurso _ que
nao P~c ser plenamente descortinado. sob pena de comprometimento de seus
pro~SI(OS - é que economia e sociedade devem ser cons ideradas como dois mundos que não Se conectam,

:fW
não


'~ '- = - S. ·~:1;;".

2. A lógica da credibilidade

Brasil D~/iwry • 17

de abril retirou o viés de alta da taxa básica. mantendo-a, porém. nos

Numa economia como a nossa, ceder aos apelos do crescimento e
do aumento do emprego mexendo em qualquer dos dogmas da polüica
econômica cientificamente comprovada implica pôr em risco a "credibilidade", segundo elo da cadeia argurneritativa que sustenta a Tina.
A necessidade de recuperar a "credibilidade" do país foi e é utilizada como justificativa número 1 para a manutenção e mesmo a exacerbação, neste início de governo, da política econômica operada pelo
governo FHC. Mas, colocada dessa forma, ela gera a expectativa de
um espaço para a alteração dessa política, uma vez recuperada a dita
credibilidade. A queda acelerada do risco-país, a recuperação do preço
dos C-Bonds (títulos brasileiros negociados nos mercados internacionais) e a tão festejada valorização do real começaram a apontar para
~o pelo menos desde o início de abril de 2003. Os jornais passaram a
.~r que "o Brasil virou moda em \'V'all Srreer" c que, para os investidores estrangeiros, "Lula é um bom negócio".
" Teria chegado ~om isso, finalmente, a hora e a VC2 da política eco':~~mica indurora do crescimento e do emprego? Lcdo engano. Além
tomar nenhuma medida sinalizadora de uma tal política nas
;~~.ais áreas (como, por exemplo, a fiscal), no que tange à sua face mais
)~YMlyel. a área monetária. também nada mudou. O Comitê de Política
.#M çp.etária (Capam), desde então, manteve praticamente inalterada a
:~'Yt.~ásica da economia em torno dos 26% ao ano", uma elevação de
:::ffi.~:~ tos percentuais ern'relação à taxa vigente em julho e de 4 pontos
;,~.~_~~ntuais em relação à vigente em dezembro de 2002.
~~~~IQ equivoco, porém, não é de quem manteve a política monetária,
j.:~~-~~~ara não dar margem a dúvidas, impôs, em fevereiro, mediante o
. i$to do compulsório dos bancos, um cone de liquides que atin;'[; m_ ~~~ase 10% dos meios de pagamento da economia. O engano é de

:~!:~~~i~~acredi{QU ou acredita que a rendição do governo petista ao can:_;d~~.reia ~o discurso lib~~~l é apen~ tem~orári~ : estratégica, n:'~}'-?:~~~'':f'~,,: para fazer a travessia c garantir uma rransrçao sem traumas .

;,~>

i'i!quc: VigoraV;lm desde fevereiro. A reunião de maio não mudou nada nessa
-,~. : e a reunião de j unho cortou irrisório 0.5%,

~:.

l)!.


1:

1-1

18 • Brasil Drlivt'ry

As autoridades econômicas deixaram muito claro. desde o início
da gestão Lula, que seria esse o modelo a ser seguido e que, porcanto, a
recuperação da economia do país, a retomada do crescimento e a redução do desemprego teriam de se encaixar dentro dessas regras ou então
não se efetivariam. Em texto recente". o professor João Machado Borges
Neto mostra, com profusão de detalhes, o passo a passo da conversão
perista aos ditames da política liberal. Numa acurada análise do discurso de posse proferido pelo ministro Antonio Palocci em 2 de janeiro de 2003, Borges Neto indica que há uma confusão no que se vem
entendendo por "transição". O mandatário número 1 do ministério
mais importante da área econômica deixou claro ali que a tão esperada
transição se refere à superação das dificuldades de CUrtO prazo, dentro
do mesmo modelo, que, segundo o ministro, é aquele que respeita os
"princípios básicos da política econômica". Não se vislumbra, portanto, no horizonte da atual gesrão. nenhuma mudança de modelo".
Posição coerente, sem dúvida, visco que qualquer sinalização, por

tênue que fosse, na direção de uma efetiva mudança, invertendo prioridades e dando primazia à recuperação do crescimento e do emprego,
poria por terra essa tal "credibilidade". De fato, a lógica segundo a
qual ela opera não permite calviolação. Uma vez. conquistada, a "credibilidade" cobra um preço alto pela fidelidade: a manutenção de rodos os
mimos que permitiram sua conquista, a saber: a política monetária
contracionista, o juro real elevado, o ajuste fiscal duro etc. Portanto,
equivocou-se quem esperava por uma mudança efetiva. Crescimento
econômico e redução do desemprego serão aqueles que o modelo permitir. Nesses marcos, eles nunca poderão ter primazia, ou seja, nunca
passarão a ser o objetivo número 1 da política econômica, simplesmente porque isso é incompatível com os "princípios básicos" do modelo adotado. Em poucas palavras, se for possível obter também esses
J MUm governo contraditório", &visla tÚz Sociedade Bmsileira dt' Economia Politica.
n. 12, jun. 2003.
• O secretário de política econ ômica do Ministério da Fazenda, Marcos Lisboa.
afirmou em uma entrevista esperar que o Brasil cresça em 2003 mais do que "vem
crescendo recentemente", "Mas, no caso de o Brasil não voltar a crescer, o governo
rem um plano B?", pergunta o repórter. "Não rem plano B. Isso faz parte de
especulações naturais que sempre ocorrem", foi a resposta de: Marcos Lisboa. C(
"Brasil esrá menos dependente. crê Lisboa" (entrevista concedida a Guilherme
Barros). Folha dt' S.Pnulo. 17/3/2003. p. B6.

Brasil Delillt'ry • 19

3. Brasil Deliuery, ou para que serve a credibijidade

resultados, por pífios que sejam, ótimo. Se não ... paciência, Mas, sendo
assim, de que serve a mo buscada c defendida credibilidade?

__

Se não é para permitir prioritariamente a retornada do crescimento
econômico e do emprego, de que serve a conquista dessa tal credibilidade? Perguntemos, em primeiro lugar, por suas conseqüências. A
mais badalada delas foi a súbita engorda da balança de capitais nos

primeiros meses de 2003, o que explica, como se sabe, a acelerada
queda de valor da moeda norte-americana que se seguiu. Mas que dólar é esse? "País atrai capital volátil; dólar produtivo seca", diz a rnanchete do caderno Dinheiro da Folha de S. Paulo de 25 de abril. Ao
contrário do ocorrido com o capital de curto prazo, cujas entradas
cresceram mais de 1.300% no primeiro trimestre de 2003 comparado
a-igual período de 2002, a entrada de capital resultante de inves~i~e~.
tOS diretos estrangeiros, no mesmo período e comparada a base idênri_.ca, caiu quase 58% . Tal assimetria explica-se, de um lado, pela inevitável
_:;átbitragem operada pelos mercados em condições de risco reduzido e
:~~X3 real de juros elevada e. de outro, pelo esgotamento da fonte que
\ pToduziu, em anos anteriores, os polpudos recursos oriundos de inves~f_tj.~entos estrangeiros diretos (não há mais quase nada para ser
1?iii~rizado, e o capital privado de bom potencial e preços irrisórios já
:~~bpracicamente rodo negociado)".
--1- ' "
I .
,:j~~:.~,Ressalve-se , porém, que, mesmo que os recursos em te a tivessem se
~~ê~ginado da banda saudável da balança de capitais, as conseqüências,

;~lt~:.

até

°

_} )~~=-1Nleforma da Previdência, na forma como estâ sendo proposta, com a insistência
__~~!"'::"':f~q::rcgime único ou assemelhado e com a insistência na fixação de um teto basran_ a;'~
~~~Fu:tid o para os benefícios a serem pagos pelo E.sta~o. deverá. rcdund.ar num
,. :-~t:"i;- - ._
. 1~~ de abertura à exploração por pane do selar privado nacional e Interna~~~
' ~iifald c um mercado previdenciário substantivo,
então "monopólio" do Esta;e~-..::
~~~goatudo . não se rraea al de uma privatiução :10 estilo convencional, mas da

':J'
-,~tuição, pata o setor privado, de uma espécie de reserva de mercado. na qual
:Jóg~.nunidadcs de ganho podem ser bastante promissoras, já que são cerca de
lá~õcs de servidores públicos no pais. A criação de fundos de pensão com~t:U'es para servidores públicos. geridos pela iniciativa privada, alids, é
mP~misso que f.u pute do acordo do Brasil com FMI assinado em agosto
_"~O{j~ e que foi tranq üilamente acatado pelo governo do PT na revisão feita
·~
. .. .. de 2003 .


! .

!

do ponto de vista da performance futura das comas externas, seriam
praticamente as mesmas, a saber: valorização da moeda doméstica e
piora nos resultados da balança comercial e da balança de serviços
não-fatores. Daí à decisão de financiar com recursos provenientes da
movimentação de estoques o pesado déficit em transações correntesportanto, déficit de fluxo - do balanço de pagamentos é só um pulinho. Não há espírito que resista a tamanha tentação . ainda mais se
junto com ela vem o brinde da moeda doméstica revalorizada, que
sustenta a ilusão de que um pais como o Brasil possa ter uma moeda
de verdade, ou seja. incondicionalmente conversível. O ideário vigente nunca associa responsabilidade fiscal e "macroeconômica" (sic) à
responsabilidade cambial.
Que os recursos que têm feito a festa do governo c da mídia. sobretudo a televisiva, venham não do lado saudável, mas do lado cigano,
volátil. especulativo da balança de capitais. só agrava a situação. Caído
em tentação, o país descuidará, mais uma vez, da divisa boa, que cria
demanda efetiva e impulsiona crescimento e emprego, e estará definitivamente nas mãos do mercado, inteiramente refém de seus caprichos, Além de tudo, a tão decantada credibilidade pode ir à lona
subitamente se. por uma razão qualquer, fundamentada ou não. verdadeira ou forjada, os mercados, hoje tão bern-humorados com o país,
resolverem mudar de humor. Já vimos esse filme antes, por sinal muito recentemente, e sabemos que triste fim ele tem.
Mas por que não intervir? Não detém o Banco Central os instrumentos que lhe permitem enfrentar tanto quedas quanto elevações

exacerbadas do valor da moeda doméstica? Aliás, não age ele sempre
assim e quase automaticamente quando o movimento se dá no sentido
inverso? Interlocutores de peso têm feito tal pregação. mas mesmo assim as autoridades econômicas não se dispuseram ainda a operar a
reclamada intervenção. Parece-lhes uma heresia impedir a valorização
da moeda nacional, mesmo que ela ocorra por obra e graça de capitais
ariscos, pouco confiáveis e dispostos a dar no pé ao primeiro sinal de
perigo. Não é demais, diante disso. relembrar o lamento de Celso Furtado em entrevista concedida ao jornal Vawr em junho de 2000: "Ago~
ra, o Brasil chegou ao extremo [...]. O triste é imaginar que um país
em construção seja entregue ao mercado".
Mais triste ainda, podemos completar agora, se essa entrega for
patrocinada pelo governo de um partido que nasceu, cresceu e fortale-

BrasiI D~li lia, • 2 I

ceu-se na luta pela construção de uma nação soberana. capaz de tratar
com dignidade todos os seus cidadãos", A "credibilidade", em cujo
nome são exigidos tão pesados sacrifícios, é necessária para manter a
vulnerabilidade do país, não sua estabilidade e a susrentabilidade de
seu crescimento, incansavelmente reivindicadas pelo PT ao longo dos
oito anos do reinado de FHC. É claramente falacioso, pois, o argumenta da credibilidade, assim como falaciosa é a tese de que só há uma
macroeconomia. Esta última só se sustenta, se é a manutenção desse
cipo de credibilidade o que está no horizonte. E a credibilidadel
vulnerabilidade de economias como a brasileira é necessária para a
valorização dos capitais especulativos que hoje dominam o processo
de acumulação, como necessários são as crises, as turbulências, os súbicos movimentos de preços das moedas fracas, as elevadas taxas reais
de juros etc. t. precisamente isso que produz a engorda do capital
especulativo no mundo e o torna cada vez mais poderoso.
.' A afirmação perem prória de que existe uma única macroeconomia,
independentemente da intenção com que é feita, esconde, atrás de sua
. - ~'~parente recnicidade e neutralidade, o beneficio de interesses muito

<~ed6cos, que estão em linha com a virada pró-acumulação financei ·r 'raido capitalismo mundial que começa no fim dos anos 1970 , devasta
~i.;~'América Latina nos anos 1990 e ainda está por aqui, firme e forte. A

.-j'SitqVtica econômica do governo do PT fortalece esse ide ário, visto que
:ift:r~.Habraçada e é defendida e a~licada pelo maio~ parti~o de esquerda
.~!j-~~~;tnundo no governo do rnaror país da América Latina, ganhando
:~%~~~ um inestimável reforço em sua imagem de política cienrifica;~91~te comprovada.

";k~.ji!,ãlve7. fosse possível argumentar que. independentemente da .

'~~~~p.g~o impôs-se como necessidade, dada a "herança. maldita" que o

.*~~ejJI:~ dcita vontade do partido e do presidente eleito. a adoção desse

,.~4~'~~}'Jt.,~ 0 anterior deixara. E como uma vez que se embarque nesse b~n­
H~~~:~~~~ é possível dele saltar sem provocar um tumulto talvez maror
~~~~1§~~~B~~ o que se tentou evitar, o governo Lula teria decidido de uma

:---

~.~~:0'"·-· !~Yi~h~9t todas. ainda antes de assumir; adotar o tal modelo e tentar
~;~1.
.".R".':-

~.t

~~.l!.o Otaviano Canuto, secretário de Relações Internacionais do Ministério
...)lnda:
"A palavra-chave é deliverv,
como bem empregou um analista de Wall

-<••' )1
...
;"';: tA gente está prometendo e a geme está entregando" (eirado por Paulo
~t1l Batista Jr. em "Paciência!", Folha ck S.PallfD. 10f4/2003, p. 84).

~%L

.
r:

; -~ '.>:.;


i:

22 • Brasil Delivay

firmemente, por mais que reconhecesse que de não é o ideal para isso,
encaixar aí seus verdadeiros objetivos (crescimento econômico,
recuperação dos níveis de emprego, disrribuição de renda etc.). Se comprovada, a tese traria pelo menos um alento: a escolha, pelo governo
do PT, do modelo anticrescirnenro poderia ser considerada uma irônica
fatalidade.
É esse, como se sabe, o tipo de argumento que tem sido utilizado
pelo governo: já que o país se desfazia como gelatina em janeiro de
2003 , tomar qualquer medida que jogasse mais lenha na fogueira da
desconfiança seria uma temeridade que poderia colocar em risco a própria governabilidade. A queda do risco-país, a revalorização do real
etc. seriam a comprovação do acerto da escolha.
Mas serão verdadeiras as premissas desse argumento? Já se demonstrou de maneira inequívoca que o país estava à beira do precipício no
início da gestão Lula? Veremos que não. E não se provoca com isso
nenhuma rninimização dos descalabros cometidos pela gestão anterior.

As perversas conseqüências para o país da política adorada pelo governo FHC são de natureza estrutural, enquamo o argumento com o qual
se justifica a ortodoxia do início do governo Lula é de natureza indiscutivelmente conjuntural. Vejamos.
4. Dezembro de 2002: o Brasil à beira do precipício?
Que problemas podem se agravar num país como o Brasil a ponto
de se dizer que ele está à beira do precipício e que por isso se requer a
adoção de medidas drásticas para reverter o quadro? O primeiro pro~
blerna, sem dúvida nenhuma, é o risco da inadimplência externa, o
famoso tÚfau/t, que o jargão econornês houve por bem consagrar. Outro
é o descontrole inflacionário, capaz de desorganizar o sistema produtivo e parar o país. Vejamos cada um deles.
A piora estrutural das COntas externas do Brasil é certamente uma
das mais perversas heranças legadas pelo governo FHC. A abertura
externa estabanada, além de elevar a dependência do pais em setores
estratégicos como os de insumos básicos e bens de capital, produziu
um substantivo estoque de capital privado nacional bom e bararo que
foi parar nas mãos do capiral estrangeiro. O processo de privatíza çâo
das estatais produroras de serviços industriais de utilidade pública impôs
a elas o mesmo destino. Como resultado, a balança de serviços é hoje
muito mais pesada, por coma do aumento do déficit na balança de

Brasil Delivay • 23

o

rendas, resultado inescapável da duplicação do passivo externo líquido
do pais. Além disso, agora muito mais do que antes, o crescimento do
, produto depende das imponações.
.
O déficit da balança de rendas (lucros, dividendos e juros), que
.girou em torno de US$ 11 bilhões ao longo dos anos 1980 e 1990, at.é
: 1996, salta para a esfera dos US$ 15 bilhões em 1997 e para US$ 19 bi·lhões a partir de então. Esse estrago estrutural teve um componente

\:adicionaL. de natureza conjuntural e de enorme peso, com os quatro
:;:''anos e meio de moeda nacional artificialmente valorizada. Daí os
f;.inegadéficits em transaç ões correntes que passaram a ser produzidos",
-;rOcomponente conjuntural foi resolvido com a desvalorização do cârn:~;6io em janeiro de 1999. O estrutural permanece e só com mudanças
::~:êstruturais (redução da dependência, diminuição do passivo externo)
';:,:pp de ser minorado.
}~\ Evidentemente, dada a piora estrutural das contas externas, nossa
i :7:k lnerab ilid ad e também cresceu e, na presença de componentes
:f.n~njunturais também adversos, pode de fato produzir crises que colo:.: "'em o país à beira do precipfcio. Depois de janeiro de 1999, o Brasil
'iJi:i :':;>"~de recorrer ainda mais duas vezes ao FMI, ameaçado que estava de
.: ~~ honrar seus compromissos externos. A primeira delas foi em ju'~ '~de 2001, quando o governo FHC, vendo cair por terra suas ex"'. tivas quanro ao volume de recursos de investimentos externos
os que o país receberia, decidiu preventivamente recorrer ao Funbtendo US$ 15 bilhões . A segunda vez foi precisamente em agos":2002, quando a turbul ência eleitoral provocada pela liderança de
. pelo terrorismo que se fez em torno disso fez. subir risco-país,
orizou os títulos brasileiros no mercado externa e, em conseqüêntraiu a entrada de recursos na balança de capitais . Foram então

~[!? Fundo de vaiares referentes a empréstimos anteriores.

..ps US$ 30 bilhões, entre saques e postergação de pagamento ao

1n.armos a sornaréria do saldo em transações correntes do Brasil no período
'~ 9 3 , chegaremos a um déficit total de US$ 1.3 bilhão no período. Se
-.. o mesmo exercício para a década seguinte. ou seja. para o período 1994·
, ndo para 2003 o mesmo déficit verificado em 2002 (US$ 7,7 bilhões).
. o é um déficir total de US$ 196 bilhões. isto é. um resultado 150,8 vezes
ue nos dez. anos anteriores.


.
,


~~ 1[ '
:.

.r;:~ ~

.

~
~

~;

,

l.Ii

n

i

" :1

~
li

.,",

i ,'

24 • Brasil Ddivay


Assim, se houve algum momento em que se pôde considerar que o
país escava à beira do precipfcio (leia-se: à beira da insolvência externa), ~res[es a reduzir suas reservas abaixo do mfnimo exigido pelos
orgarusrnos internacionais, esse momento foi em meados do ano, ou
seja, julho e agOStO, culminando com a assinatura do terceiro acordo
com.o FMI no exíguo período de três anos. Poder-se-ia argumentar
que ISSO não teria sido suficiente para tirar o pafs dessa situação, uma
vez que o valor em reais do dólar norte-americano continuou a subir,
enquanto o risco-pais não cedeu. Mas serão esses bons indicadores
para o que se está querendo medir? A verificaçãodo cornporrarnenro do
nível de reservas não produzirá uma indicação mais concreta? Quando
Se observa essa variável, porém, o que se nota é que ela apresenta um
comportamento surpreendentemente estável ao longo de 2002, com
níveis muito semelhantes aos verificados durante 200 i. As reservas
começam o ano em cerca de US$ 36 bilhões (a média de 200 I foi de
US$ 36,3 bilhões) , oscilam para US$ 33 bilhões em abril e maio,
alcançam a faixa dos US$ 40 bilhões em junho e julho , ficam na esfera
dos US$ 38 bilhões em agosto e setembro e dos US$ 36 bilhões
no bimestre segui me, fechando o ano com US$ 37,8 bilhões. Notese, além do mais, que fez parte do acordo com o FMI a redução de
US$ 10 bilhões no nível mínimo de reservas exigido (que cai enrão
para US$ 5 bilhões), uma cautela adicional que, como se vê, o Brasil
não precisou utilizar.
Em dezembro de 2002. portanto, do pomo de vista das condições
necessárias para honrar os compromissos externos, a situação eslava
equacionada. Além disso, e este talvez seja um elemento ainda mais
importante, a balança comercial vinha apresentando resultados absoIU.tamente su~r:endentes, sup~rando em cerca de 50% as previsões
fCitas pelo propno governo. Assim, do ponto de vista da performance
finura das contas externas, em dezembro de 2002 as expectativas eram
muito melhores do que as existentes, por exemplo, um ano antes, quando se esperava um resultado positivo nessa área, porém não na magnitude do eferivamenre obtido.
Em outras palavras, isso significa que, com o acerto do câmbio, as

conras do comércio exterior começavam a caminhar na direção certa.
~ bem verdade que a redução no ritmo do crescimento econômico
em 2002 deu uma mãozinha para a obtenção de resultados tão favoráveis, visto que reduziu o dispêndio previsto com as importações. Po-

..._--------_......

. ~"-~ , ,,,,,, ,, '\ ,

Brasil DajlJ~ry • 25

rérn, analisando os dados dctalhadamente, percebe-se que o resultado
mais expressivo paIdas exportações. Em dezembro de 2002, por exemplo, quem comparasse o valor das exportações e importações no período julho-novem- bro daquele ano com os mesmos valores no mesmo período do ano
_" anterior teria percebido um crescimento de cerca de US$ 5,2 bilhões
-. nas exportações, contra uma queda de apenas US$ 3,2 bilhões nas
.: importações. Essa tendência, já perceptível no último mês de 2002,
.;foi se confirmando integralmente em 2003. No perfodo janeiro-maio
:-:de 2003, as exportações alcançaram um valor cerca de US$ 6 bilhões
. ; maior que o obtido no mesmo período de 2002, enquamo o valor das
f-.I:mportações ficou praticamente estável: US$ 19,1 bilhões em janeiro} Ün aio de 2003, contra US$ 19 bilhões no mesmo período de 2002.
)f{ .' Considerando, de um lado, o comportamento do nível de reservas
A&_Çt-de outro, as boas perspectivas da balança comercial já claramente
:i/};p.erceptíveis ao fim de 2002, c considerando também que já havia sido
;$113#inado o acordo com o FMI, o que permi.ciria enfrentar qualquer
fg t.§mpestade inesperada, fica muito pouco plausível a versão oficial de
JJfq~e as drásticas medidas monetárias e fiscais tomadas no infcio da
:!át'fi~ Lula teriam sido necessárias porque o Brasil estava "quebrado",
""~""~'.
" b eira
. do precipício,

. , " "
do como rnanterga
. " , "se desrazen
c
do
AI=7·
derreten
tft~H~-~o gelatina" etc.
f~~~~[Mas o contra-arj;umemo já está pronto: o problema era a inflação.
~~-9.Í!~::sc mostrava completamente fora do controle. Iniciar o governo
~ permitindo um descontrole monetário dessa ordem seria como
-_
_ ~~
~ ::.:~~~ logo de cara um atestado de incompetência e comprometer a

fevereiro.

,~"
~~,- ",-k:-ais substantivamente elevados teria se imposto como necessida"' ":_~em como a elevação do compulsório dos bancos implementada

f;f "" ~'Wdade da gestão. Assim, a manutenção dos juros básicos em nftg- '

r

"-

I~~de o início, vendeu-se o argumento de que as taxas de juro só
,,~~ baixar quando a inflação cedesse. Por trás dele, encontra-se
~~~rvado r diagnóstico de que o súbito su rto de elevação de pre~~ o país experimentava era decorrente de inflação de demanda,
,~i:s~ nesse caso é que uma taxa real de juros elevada pode ter

~~~pel para resolver o problema, uma vez que inibe os investi-

;J~ pode COnter o consumo, o mesmo podendo ser dito do corte
:' ez, S6 nessas condições, aliás, é que poderiam ser constituí-

:~~:

~~~ji: }f:~. :

- - ...


ri

j

"

1

t"
" I

'"I
1,1

':'1'

I !


" !I I

:"i

:. :

! 1I1 ii

lill!
i

'\'1,
, I.

i: t.

26 • Brasil Dai,,",
~os novamente mecanismos informais de indexação que voltassem a
Jogar para a frente a inflação passada, reinaugurando um movimento
muito conhecido da economia brasileira. Mas como defender um tão
ímplausível diagnóstico com a economia estagnada e o desemprego batendo recordes atrás de recordes? De onde poderia estar vindo tamanha
pressão por reajustes de preços, de modo que comprometesse a estabilidade monetária do país?
. Evidentemente o problema não era esse. Como é sabido, por conta
Justam.ente da turbulência provocada pelo processo eleitoral. o preço
e~ re:als da moeda norte-americana disparou a partir de junho de 2002.
atl.ngmdo quase R$ 4 em setembro. Com a defasagem que sempre
existe nesses :asos, os índices de preços passaram a incorporar esse
choque a parnr de outubro/novembro. Acrescente-se aqui que, na cesta
de ~ens que dá a base para esses índices - e, portanto, também para o
Indice de Preçosao Consumidor Amplo (I PCA) do IBGE, que é o índice

acompanhado para efeitos de controle das metas inflacionárias -, têm
peso muito substantivo as tarifas de serviços industriais de utilidade
pública, bem como os chamados preços administrados. como combusrfvel, gás etc. Nessas circunstâncias. era evidente que a absorção
total do choque provocado pela elevação súbita do câmbio, mesmo
com sua. redução posterior (ele fecha o ano na faixa dos R$ 3,50),
demo~at1a alguns meses, visto que a assincronia existente no processo
de reajuste de preços tornaria impossível que todo ele fosse absorvido
de ~ma só vez: Portamo, fosse qual fosse a condução da política rnonetária, pelo menos quatro ou cinco meses de índices elevados existiriam
como mera conseqüência da elevação do preço do dólar entre junho e
setembro de 2002.
. Nã~ existia. pois, nenhum indicador de que o processo inflacionáno esnvesse fora de controle. Evidentemente essa elevação súbita de
um dos pr~ços mais importantes da economia teria conseqüências do
p~nto de vista do comportamento dos índices de preço, mas era perfeitamente possível saber a extensão do estrago. Ele estava limitado a
uma reconfiguração da estrutura de preços relativos. que. ao fim e ao
c:-bo, não é de todo ruim para a economia brasileira - ao contrário -.
VISto que tende a reduzir os vazamentos e engrossar as injeções de
de~~~ na economia doméstica. Não existia, por absoluta falta de
oXIgemo na economia. nenhuma possibilidade de essa reconfiguração
de preços se transmutar num descontrole monetário e/ou desencadear

Brasil Dtlivtry • 27

mecanismos informais de indexação que ressuscitassem a inflação
inercial. Na ausência do câmbio. a âncora do sistema de preços estava

'>;

e está na taxa de salário",
A correção desse diagnóstico prova·se pela mera verificação da trajetória dos indicadores de preços entre o fim de 2002 e o primeiro
semestre de 2003. Todos eles. independentemente da cesta de bens

.que lhes serve de base, descreveram o mesmo movimento: elevação a
'partir de agosto/setembro, atingindo pico em novembro. e queda
~acentuada a partir de dez.embro/janeiro. O IPCA do IBGE, por exern,;::plo, que chegou a apresentar um crescimen~o d~ 3,02% e~ novem';bro. caiu para 2.1 % e 2.2% em dezembro e janeiro, respe.c[l~amente.
:'.,teduzindo-se de modo sustentado a partir de então. para anngir 0.22%
·de crescimento em maio. O fndice Geral de Preços - disponibilidade
:·!l ;.:interna (lGP d.i.), que assustara a todos com seus 4,21 % de cresci) f;Úinento em outubro e 5,84% em novembro, já havia caído parn 2,70%
;$&~m dezembro, experimentando uma trajetória acentuadamente
"'~';!Etieclinante a partir de então. a ponto de indicar uma deflação de 0.67%
!it~thm maio. Ratificando essa intetpretação, diz a economista Eulina
:~~unes'. da.equipe de índices de preços do IBGE, ao comentar a redu~~o no ritmo de aceleração dos preços no início do ano: "A inflação
do ano passado foi eminentemente de
' ;!;.tV '::'"..,<"'·' ,
"10
j;'
7" '~ os. provoca da pe Ia al ta do dói ar.

.~4~~AA9 caiu por acaso. A inflação

de que o

ca~ter

drástico das políticas monetária e fiscal se

.

}f!f!.dd .Paulo, 15/312003, Dinhdro. p. .<\.
c d
• ~o com todas essas indicações e com a intensa queda verific;ula, o chefe a
"'.~~o do FMI no Brasil, Jorge Marque:t-Ruarte. foi capaz de drzer, em abril, que

,:_-tinha de ~agir de forma mais agressiva para conlrolar a inflação", dand~ a
-:~er que em preciso elevar os juros e cortar ainda mais a liquidez da eccnomia-

~:~ por Chico Santos, ~lBGE rambérn diz que a inflaçáo caiu em fc:vereiro~.

=~::.~uasc: 50% deles.

.' sendo feitos entre t(';l.balnadores e emprega ores, a in açâo ate os saianos

'.0$ jornais têm mostrado que, quando se analdisa o conteflúdo dbos acord.~~~q.ue

': :Ílterruptament e desde [aneiro de 2002. Em abril de 2003. esse valor foi, em
~trnos reais, 7,5% menor do que o valor verificado em abril de 2002. Finalrnen-

~p~~m::tfPtal

::~~~ ""Wortant O, também nesse caso soa írnplausível o discurso governa-

~-~f

.:.~'

""

i,~_;'':~"

;~~

,ij~:


~

,~_~~_~,~.,
. ~'~

"

~1~·_

b~~ :


,.

4U
&

J,i1.ulJ Ut'Jlvny

r~~~~~-çgffi'~o dilaceramento

f~~-'

~~

~"t'

~~~

l~~~


Br:uil1J~lilJ~')' •

, s públicos aos setores da sociedade que menos carecem de renda .

--:cio de taxas de ju ros desnecessariamente elevadas. enormes transferências de

- ....: :_ neecssidade de produzir superãvks, configurada no ato de patrocinar,

·2~~tual política teria de ser reprovada, dada a irresponsabilidade flagrante. com

-:~~do. mesmo cons iderando dessa forma estreita o conceito de responsabilida-

-~ ~ ~

~~f!a de S.Pauw, em meados de 1996, que o modelo não era mes-

l~i~nte FHC chegou a dizer, numa longa entrevistaao c~.dcrno Mais!,

impôs como necessidade para "afastar o país do precipício", "estancar
A defesadesses interesses, porém, vem sempre embalada na retório processo de dcrre(Ímenro da economia" etc. Mas defender essa interca
do respeito no trato da coisa pública, da necessidade de transparênpreração foi funcional para o governo em vários sentidos. Em primeicia austeridade e gestão fiscal responsável, bandeiras extremamente
ro lugar, permitiu demonstrar à opinião pública a "correção" e a
sedutoras
para a esquerda, que sempre as defendeu por aqui em função
"responsabilidade" da política adorada ("Viram como a elevação dos
da folha corrida de corrupção e desmandos que caracteriza a história
juros era necessária?", "Viram como eram necessários os cortes orçade nossa direita no poder. Quem em sã consciência pode ser contra a
mentários?". "Esrã ar. Os índices inflacionárioscederam!"). Em seguncransparência e a gestão responsável dos recurs~s públicos,.ainda ~ais
do lugar,permitiu também criar um espaçopara a manutenção da taxa

,no Brasil? Mas, como os argumentos são vendidos em conjunto, le-se
real de juros em um nível tão elevado quanto estava quando o país
. facilmente, por cxernpio. a críticaà política mo nerária por sua demasiamudou de mãos. Com todo o fetiche criado em torno do nível da taxa
:'
da austeridade como uma defesa da irresponsabilidade na gestão do
básica de juros e com o argumento incansavelmente repetido de que
:
,:dinheiro público. Confunde-se deliberadamenteo papelda União como
ela s6 cairiaquando a inflaçãocedesse, abriu-se um espaço para a redu': -ente da federação - que, enquanto tal, devegerirde maneiraresponsável
ção nominal da taxa com a manutenção ou mesmo a elevação de seu
, ;:0 5 recursos orçamentários de que dispõe - com o papel do governo
nível real. Por exemplo, a reunião do Capam de 18 de junho Cortou
.~
;.Jederal- na qualidade de planejador, de autoridade monetária e produem m~io ?ont~ per~ent~al a taxa Selic, mas, considerando que a ex._-':-tor de moeda e liquida, de gestor do crédito, de guardiãode reservas, de
pectanva inflacionãria caru da esfera dos 12% para alguma coisa abaiI~;1ina1izador e promotor dos caminhos que a economia deve trilhar.
xo de 8% em 2003, é evidente que a taxa real é agora (meados de
;';~;.~1:;:::· Graças a uma confusão de mesma natureza, assada-se também de
junho) muito mais elevada do que no infcio do ano.
:i~;~iforma imediata política econômica liberal à estabilidade monetária,
Mas se o perigo não vinha do fronr externo nem do descontrole
i~~~0~mo se a paiItica econômica não ortodoxa fosse .neceSsariamente C01tmonetário interno, que mais poderia ser alegado? Certamente o risco:li:-'- tfa a estabilidade - cúmplice, portanto, de medidas que, ao fim e ao
país elevado, o dólar supcrvaJorizado e o preço reduzido dos rftulos
-:1;~-'~ o, levam o país à hiperinflação, Assim, qualquer governo que busbmsileir~s no exterior. Como vimos, porém, a redução do risco-pats e
~~!ili~- uma alternativa será irresponsável, visto que govern? "re~.ponsá­
a revaIonzação da moeda doméstica são antes perversas do que benéfi-:L;~i;'}:~)l:é justamente aquele que evita essa rata, fazendo, para ISSO, tudo o
" 'i'! "'~-' '1''-;·. c
á . n 11
~ ao país, Elas podem aprofundar o verdadeiro precipício que é so":i.~f!ji·HIM,.~:lo r necess no
.
cial e no qual o Brasil está metido há pelo menos uma década, preso

_t~~,i:
{~Mas essas confusões sãõ, mais do que nunca, funcionais. O gover.\ ,.. >~ ~ •• p que esrã nas armadilhas de um modelo no qual crescimento e emprego
:c ::?J.?'t~no';'{àllterior não enfrentava grandes problemas nem entrava em contranão são prioridade.
L~f~~~ ao defender e praticar uma polftica econômica de cor~e liberal.
q.i~}i~~·,~~unca pretendeu ser de esquerda nem se preocupou efetivamente
do país, provocado pela desigua~dad~. que se
e "í'i!Unda de modo inescapáve1 com a adoção da política liberal. O

5. A sedução do discurso: a identificação espúria
entre gestão responsável e política econômica liberal

Retomando um POnto já anteriormente discutido, a defesa desse
,:,~deIo, que se mostra de validade universal por se apresentar como o
urucoverdadeiramente científico, encobre na realidade interesses muito específicos que estão em linha com a primazia assumida pela valorização financeira diante da valorização produtiva desde o início dos
anos 1980. Esse padrão de acumulação. do pomo de vista de seus resultados sociais, se é ruim para os países do centro do sistema, par:l
países como o Brasil é simplesmente nefasto.

2~

-

.


30 • Brasil D~liwry

qüil ame nte sob re qua l seria O númo para os excluldos e dissertou tran
a que se beneficiasse da
~ero.ddes_(18, ~6: 30 milhões?)u. Assim. aindvel e polírica eco nôm ica
l~ent1fiC1ça~ esp~na corre gestão fiscal responsá

necessária ao gov erno tuca no.
liberal, essa ldenClficação não era de faro
ado res, Com as limi taMas num governo do Par tido dos Tra balh
pate nte a con trad ição gera da
ções que sua hist ória lhe imp õe, é tão
neo emb aral ham ento se torn a uma
com a ado ção dessa pclnica que
estendê-lo, prol ong á-lo . As auto ricessidade. ~a~s aind a, é prec iso
usar o jarg ão ante rior e falar em
dad es eco n ôrmcas com eçar am por
falar em resp ons abiJ idad e
responsabiJ~da?e fiscal; passaram dep ois a
do
o dete rmi naç ão vind a do Palácio
mac roec ono mlc a; e agora, seg und

soci
rnéstica, tudo em nom e da "jus tiça

e zero, Cortes orçarnenPJ~alro, s6,se falará em "justiça social": fom
ais, meg assu perá vits , refo rma
rãrios, :o:alJ~aç~o dos prog ram as soci
ção artificial da moe da do.
da P~vldencla, Juro real elevado , valoriza
al",

Lula: lim ites e alte rna tiva s
6. Política eco nôm ica no gov ern o

preside~te


a pos tura deve enfr enta r limi tes
Evi den tem ente a man Ute nção dess
inegável cari sma do pres iden te con
tant o sociais q~to poltricos. O
con tinu ar a defe nde r esse mod elo.
cede -lhe um precIOSO espaço para
as
. Ten do em vista a prom essa , tant
Con tud o, m~s mo isso é limi rado
de
coral, de criação de 10 milh ões
vezes defe ndId a na cam pan ha elei
ano e mei o com o dese mpr ego cres
emp rego s, passado um ano ou um
do
o pos itiva do pres iden te Lul a e
cen do em vez de cair", a avaliaçã
iulaç ão pod e não resistir, A con tinu
gov erno do PT por part e da pop
ento do núm ero absoluto de rnisedad e do fosso social, com o cres cim

11

I, ~ ~n~úências

em 1995 . segu ndo dado s
FHC equivocou-se nos números, J;l
O entã o
de pobreza

brasileiros vivendo abaixo da linha
do PNUD, havl a,38 milh ,ões de
pobr eza de:
m ilhões vive ndo abaixo da linha de
de US$ I per capua por dia e 70
ente o
quer dizer , com o lemb rou rece ntem
US$ 2 per apit a por dia. (O que não
so do
logo acima da linha . viva-se no paraJ
profcssor Francisco de: Oliveira. que,
cons umo ...)
elo j;l se têm feito sent ir nos
perversas da exacerbação desse mod
sent a uma
. O PIB no prim eiro trim estre j;l apre
IndiCldores de prod ueo e emprego
cres dme nto previsto pelo próq~e:c1a de:0, 1%. evide:mememe com prom eten do o
e hoje
estim ado em 2.2%, caiu para 2%
PTJO governo para 2003 . que: com eçou
os indic ador es são os maiores
Do pom o de vísta do dese mpre go,
to para o Seade/Dieese:.
es e 1994 , tanto para o IBGE quan

:~ e:m 1,6%.

1?-'ào


;=i;:do

': ;'hda

as

tsrasrt

U~I"'ay

• ;"

des
apro fun dará a viol ênci a nos gran
rávcis J4 e a falra de perspectivas,
seja m os esforços env idad os na área
cencros urba nos . por mai ores que
indú stria do narc orrã fico , únic o
da segu ranç a púb lica . e esti mul ará a
stan tiva da pop ulaç ão, vem se mos
. "set or" que , para uma parc ela sub
vista do "emprego". Esse últim o e1emen,:. uan do "promissor" do pon to de
as
desgraça tam bém com as. cha mad
~.Lto pod erá fazer o gov erno cair em
as
ecer que setores sub stan tivo s dess
;:"~'d asses médias. Não se pod e esqu
a refo rma da Prev idên cia.
.I~dass es serão dire tam ente afet ado s com

início
estr atég ia já são sen tido s desd e o
':::. :: Os limi tes polí tico s dess a
hab ilid ade s do min istr o-chefe
gov erno . Por mai ores que seja m
ficará
te do Par tido dos Tra balh ado res,
'.;H â a Cas a Civ il e do pres iden
o de que a opo siçã o aos pro vez mai s diflcil ven der a inte rpre taçã
de~~is ~ar~i.~os de esquer~a se
~;ttJ ~os do governo den tro do PT e dos
os princítrês ou qua tro radicais , Dad os
'[Ã\~têstri nge a um grupelho de
a vida do part ido e a hist ória
~~~JtP..!os e os valores que sem pre pon tuar am
sop rar
afir maç ão, se o ven to com eçar a
.pt~jto rios a de seu cres cim ento e
mui to rapi dam ente ficar em rnilado con trár io o gov erno pod erá
do
a
gue a aco ntec er, a opo siçã o vind
.~~~,~iiljria. Mes mo que isso não che
vez
e a ficar cad a vez mai or e cada
;:~~ ili.jerio r do pró prio part ido tend
s~~7.,~h1'íüs difícíl de con torn ar.
ser. sufites sociais e polí tico s pod erão não
- . ;(~~~[~ claro que esses limi
, na Intercrise inst ituc iona l. Uma vez que

. . t~~ª eÍítes para defl agra r uma
a ven ceu as eleiçôes

- ~-'-~

orga niza dos .
~~~&.apoio que perd er nos setores mais

res
l"~·@t;:;:- ~m~asn e com pen sar com os seto

I ~ -~:,. " ' -:-:-1 ::': :"'~~

eira ", Lul
l·· '::~~i1p:@ação do professor Francisco de Oliv
ovid a pepela desa rrum ação das classes prom
{.' ·: ·~~~i~6;:.yácuo social deix ado
and•a
com
m
que
s
não se sabe mai
A.

F<;-J~J&i'Ó ito ano s de FHC, de mo do que
ias, mai s
ta o quê . fica, nessas circ uns ranc
J'~~~i~:9,('qt;ê nem que m repr esen
nto natu ral de "falar direra~enre

~E}:f··;~:f,4.~para o pres iden te exercer seu tale men os orga niza dos da socieda-

~f;-~

~~~.

C//-'!i

~ft

a com
~---ma pequ ena redução possa.ser obtid
'; :: mo que em lerm os relativos algu
iouco é fácil, o núm ero absoluto cont
~as com o o Fom e Zero . o que tamp
no
to da população despeja a cada ano
~$á a crescer, uma vez que o crescimende
não enco ntrar ão onde
enas de milhares brasileiros que
- .-e:~ do de traba lho cent
orend a mon etãri a regular. Não disp
sua mão -de- obra em troca de: uma
~
ços que o
"oficial" de acessar os bens e servi
--: ;por isso, de: nenh uma form a
na TV.
..' do cons umo apre sent a rodo dia
a conc edida a Fern ando Had dad

man ter o estad o de rebeldia" (entrevist
.
Paulani), &porragmr, n . 41 , fev. 2003
" ' 50


32 • Brasil

""

DfÜV"]

Evidentemente não estão também afastados os riscos de uma crise
stricto J~TlJU econômica, antes o contrário. Como demonstramos, o
modelo estabilidade/credibilidade é na realidade muito instável. Qualquer mudança. de humor do mercado financeiro mundial com relação
ao Brasil - variável, aliás, sobre a qual temos um poder de arbítrio
muitíssimo lirnirado - pode desencadear um processo que, ao fim e ao
cabo, leve de fato o país ao tão temido defiltllt. Desnecessário dizer
que, nessas circunstâncias, em meio ao agravamento da questão social,
a crise política será inevirãvel.
É bem verdade que, num caso como esse, o Grande Irmão do Norte poderá comparecer com sua ajuda. O atual presidente do Brasil,
conforme ~gi tam algu~s~está sendo guindado, com sintomático apoio
norte-americano, à pOSlça.O de "líder mundial" - um convite difícil de
recusar -, e o Brasil. por conseguinte, sendo apresentado como uma
espécie de vitrina das maravilhas da nova ordem mundial. Apesar do
e1e~do preço a pagar, essa circunstância nos coloca numa situação
multo ~Iferent~ ~a que tem sido experimentada, por exemplo, pela
Argentina nos ultimas anos , tornando-nos, de certa forma. imunes a
crises. Se a hipótese estiver correta. os constrangimentos enfrentados
pelo governo Lula paro efetivar as prometidas mudanças - que implicam a.hera~o no ~od~lo econômico - são muito maiores do que se

pode Imagmar à pnmelra vista.
Finalmente, é preciso frisar que, mesmo que tudo corra exatamente como previsto, ou seja, que não ocorram crises sociais nem
políticas. nem econômicas, e que tudo dê certo, o que teremos, ao
fim da gestão Lula, mantido o atual modelo, será um crescimento medíocrc, com muito boa sorte um pouquinho superior aos 2% ao ano
obtidos na última gestão de FHC 6 • Se a "credibilidade" continuar n
en~ordar a balança de capitais, auxiliada pela manutenção de uma das
mais elevadas taxas reais de juro do mundo, a revalorizaçâo da moeda
doméstica prosseguirá e desmontará o que necessitou de uma violenta crise (janeiro de 1999) e mais um ano e tanto para ser montado.
junto com isso, redução de direitos, asfixia do debate, império do

16

ao ano.

A JU
' Igar pelo que: deve ocorrer neste ano, para que essa média anual de 2%
se: efetive, o crescimento no período 2004·2006 te:r;! de:ser, no mínimo, de: 2.7%

Brasil Drlivrry • 33

discurso único - em urna palavra, um totalitarismo de mercado que

::'/e3J'e

ficou apenas nos sonhos de FHC.
.
Mas qual seria então a alternativa? Ela existe, afinal? Como espera~
s ter demonstrado, a idéia de que não há alternatÍva s6 se sustenta se
. ':~bjetÍvo maior for manter o país nos marcosdo tipo de "credibilidade"
_: que aqui se descreveu. Se outros forem os objeti~o~, outra dev~rá ser a

':' lítica econômica, e ela existe. A pretensão ongmal do Partido dos
.' po
I " H .
.) j-1 iabalhadores era comandar um governo"democrático e popu ar. OJe
ce claro que temos de nos conformar. com algo bem men,os pre~
J:';~,:tensioso. Mas, mesmo para um governo Simplesmente r~for~llsta :- o
:~J~> que não seria pouco, conside~ada a atual,q.uadratura da ~Istóna c~plta~
:-é~lista _. muitas mudanças senam necessaflas no que hoje se pratica. A
'~;tltomeçar. é evidente, pelo nível excessivamente elevado da taxa f:al de
't~'Juros, o que é indicado de modo ,c~ro t~nto p~e1o cupom cambial da
~{:\~M &F quanto pelo mero sornarono da I~flaçao :sperada com a~ taxa
;~~ilé juros nane-americana engordada pelo rísco-pars- E ~ma redução da
:';*:,cl:xa de juros não produziria apenas os inequívocos efeitos no nível de
,~Up~dução e emprego. Ela seria capaz também de es~~nc:'r o ~roce~o
:;.§}ª e apreciação desmesurada 'do real. Do ponto de ~lsta mflaclonárlo.
:~f:~iAclusive. e se é para se levar em conta as expectativas, melhor será a
1:~'@lU1utenção da subvalorização do que da sobrevalorização da moe~a
,.fu1\~AAméstica. já que a primeira aponta perspectivamenre para a redução
,. 5g{\i'áô':va!or em reais da moeda norte~americana.
à política carqbial propriamente dita. além da evidente
de o Banco Central atuar como regulador do mercado.

'~~!Iifcessidade

t. ''ft~11.~:.Quanto

;:

~;Q~jmesmo sentido,


'~i,j~ft~?edindo bruscas oscilações, ~er~se-ia pensar n~ taxação do ~pital
~~~~~~fUrto prazo ou na estab~le~lmentode a1gu~ tipO de. carência, em
~';;~~V~, pensar em regular, mlOlmamente que seja. o movimento. ~esses
~;{,~ ' ··'·~pJtais. E já que se trata de gestão responsável , a res~onsablbd~de
""""bial é o melhor antídoto contra a tentação do popuhsmo cambial.
atrelar a queda da relação dívida-:pIB ~ sobn:-

;'~

:fi.-: -';'. 5~t.il.ô'mação da moeda (em função da substantiva parcela da díVida cUJa
:'}j,-.< ~~~fização está atrelada ao comportamento do câmbio) é trocar uma

4-~ora ilusória agora por uma piora potenciada no fu.turo, quando
..~o se combinará o déficit fiscal que esfola com o déficit externo que
':~.. Por uma questão de aritmética elementar, a queda sustentada

_.1léhominador e reduzindo a do numerador. Como subproduto dessa

,':;~~lelação só será possível aumentando a velocidade de crescimento

!:~.~

, ---

•• --

-

~f~~ éÂMAPJ\ DOS DEPUTADOS· CEDI- BIBLlOTEC~


.';


.14 • Brasil
J)(/illn')'

José Luis Fiori, "Mirem-se na Espanha", Carta Capital. 16/4/2003. p. 50-2.

I

queda, também reduzida seria a necessidade de superãvits fiscais, abrindo-se espaço para atuação efetiva da polfrica econômica no sentido da
indução do crescimento do produto e do emprego.
É pequena a :ogência, com~ se vê. Para falar nos termos que são do
agrado d~ auton~ades econ ômicas , nada de invencionices, de mágicas.
de ex~edlentes mirabolantes. Apenas reformismo. Mas não implicaria
tud~ lS~o uma mudança de rota, uma sinalização de que a acumulação
capu:alma em nosso pais voltará a ser pautada pela produção e não mais
pelo mero rentismo? Evidentemente! E, para operar essa mudança de
rota, o ~verno ?o ~ido dos Trabalhadores tinha, logo em seu início,
um capital político inestimável, que talvez já tenha sido rifado. Hoje,
para ?perá.la, se~o necessárias, mais do que antes, coragem, vontade
política e determinação. Mas não se diga que não há alternativa,
Persistir na atual polüica condenará o governo do PT ao mesmo
destino do governo "socialista" de Felipe Gonzãlez na Espanha da dé:a&a.de I ~8~. ~omo afirma José Luis fiori em artigo de advertência:
J-:loJe, a distância e o tempo já permitem um balanço mais fiel do que
foi ~ e~ Gonzâlez. E não há dúvida de que sua gestão 'socialista' do
capitalismo .espanhol acabou ficando indiscernível da gestão conservador: e neohbe.raI do gov~rno Thatcher"!". Assim, a continuar o que
esta aí, por maiores que sejam os contorcionismos retóricos das autoridades, não se poderá dizer outra coisa do governo Lula senão que vai
ficando mais e mais parecido com um capitulo adicional da era FHC
o mais melancólico decerto.


17

_.,.
: -:-, .. .

~-;:
:;'.:.{ .

!4~~" .

o BRASIL COMO PLATAFORMA





DE VALORIZAÇÃO FINANCEIRA E\TERNACIO?\AL
(um balanço da política econômica
do primeiro ano do governo Lula)

:!$Onõmlca que

fOI

a toruca dos

Oito

anos antenores, sob Fernando


~.ntrara~ aí o áli~i pa~ ~ontinua.r e aprofunda~ a prática da.polhi-

~"tdezembro

:" Jtibncra

::FJf! ...

~J~}:" A vitória do Partido dos Trabalhadores (P'T) nas eleições presiden~Jili8ais de 2002 criou expectativas diferenciadas: tenebrosas para alguns,
1ç~fJ:vissarei ras para a grande maioria. A idéia de que o povo começaria a
;..t.:
. ;.~~:0,~tiansformar
o Brasil numa nação tornou·se muno presente e parecia
-%l~~~fffialmen[e estar ao alcance da mão. Forjado nos duros anos de luta
a ditadura militar que se iniciara em 1964, nascido de baixo
~~t.~~'&'~ cima _ dos movimentos operários do ABC paulista - e tendo
c~::~~a liderança da qualidade de Luiz Inácio Lula da Silva, o PT parecia
-~~ado para comandar a dura tarefa de retirar o Brasil de sua sec~lar
L)}~l~a e das disparidades e desigualdades sem par que ela p~trocma.
i~:-{
~ão foi dessa vez, porém . A esperada refundação da SOCIedade fiU~~;
- ~'para depois. Ancorados num diagnóstico catastrofista, de que o
~~;
:~!estaria à beira do prêcipício econômico no per íodo pós.eleições,
de 2002, os que tomaram posse em janeiro de 2003
k~~.

f.;,,-


lt~

li!;
,
,,

f!

t'íf

~~

'
I

"':'que Cardoso (FHC).
:\ ;'.oje, maio de 20,?4, .fie; mais claro do que nunca que n5.o se tr~ta,~ absoluto, de rática - como apregoavam -, de tapar o nanz e
t ,!um
,
a ~o1ftica amarga, odiosa, mas ne~essária para "salvar o pa[s~.
~Ç9ntráno. tratou-se de uma escolha dehb~rada, de manter o Brasil
1'"._:." o na mesma armadilha externa, desde que isso não colocasse
.:~ o projeto de poder do PT. No que se.se~e, buscaremos recu~~ modo detalhado os argumentos que Justificaram essa escolha,
:~_ar sobre qual é de faro a natureza do "modelo" escolhido e fazer
-" . ço de seus resultados.

-

.


.; .-

""


':~:~~~~l~~~~~;'

:/:~ ~"?..,'i~7.1 r~S~eia do Brasil beira do precipớcio'

36 8 "i1 LXliveg, ~ "" ..,;.
as. . ..ỗ~:~~:fii~.;:~
~f~;'~- .~~ : ' ~"-''''. ';' '

-t,

. .

' "" ,>,<~ 'O'_-e'

~~-= -





em

l,

. .i~t\)~.k'-" Il~i{daqueles que esperavam nóo uma polớtica econụ

. I' - t:
Aii~,:sw:R-" . .. .
r que a mten. ,~~-:::; ,"f~~?;:':;'eJi1~fuas uma sina izaỗao nrme para mostra . b
'I'
d
.
rnlGa:aventtl!,=. ,..{'..i1ụ
_ ã.~::ã;'b~WgbVột. -, era Ir aos poucos renran o a economia rasi eira
:'~~i{ij{~;~~t~a que se enredara, as autoridades brasớleir:s
reCbK~p~tinham sempre pronta, na ponta? a lớngua, a expl~~
ca~~Đi!n~.~pera~o compor.ra~ento: .c,ra preciso. ~nr~ d.e m.als
jusrifi'" naditt.ớêK9f~ "da beira do .preclpl~IO. FOI ISSO .que ~e ~niclo
l)/das taxas bỏsicas de JUros (a Selic atingIU 26,5% ao
~
. 112fli%
couã..:~~
ano);~@@il?ụrte de liquidez por meio do aumen to do compu lsúrio
- dos &ffillil1~õ'surpreendente elevaỗóo do superỏvit primỏr io para alộm
d ~ i:-'.'if.;.'ó3t*,H~ FMI (4,25% contra 3,75% do PIB).
o .~gt~o.ã.1< . .. ,
. !~qfJ1~?:~aseava o novo governo para afirmar tóo sombria situaỗóo?
No" ~lĐ~ento de trờs variỏveisque foram, a partir de entóo, defini:onadas no posto dos indicadores ỳnicos e absolutos da
.~fi~hp
tivariớ
'.<
.
no, a com"saỳd~<:~n6mica do pais: o preỗo do dúlar norte-america
'CBond {tớtulo brasileiro negociado nos mercados inrernacioỗỏo'ó8.
..- ..
ao fim de

naisr~Liii:isco-pais. De fatO, essas variỏveis encontravam-se,
2o(j~I~ nớveis indesejados. O dúlar chegou a atingir R$ 4 (fechou o
ano e~ 'R$ 3,50), a coraỗóo do C-Bon d ficou abaixo dos 50% do valor
de fu~;.~ o risco Brasil alcanỗou os 2 mil pontos. Mas a que se devia tóo
adversocomportamenro? Basicamente especulaỗóo gerada com aquilo
que se convencionou chamar "terrorismo eleitoral", orquestrado pelas
elites e pelos interesses nacionais e internacionais em vista da possibilidade concreta de uma vitúria de Lula. Nóo fosse o processo eleiroral,
dificilmente esses indicadores teriam se compo rtado dessa forma .
O risco maior que influencia o compo rtamen to dessas variỏveis ộ a
perspectiva de uma inadimplờncia externa (defalllt), ou seja, de que.
em determinado momen to, o paớs nóo possua as divisas necessỏrias
para honrar seus compromissos externos c/ou sú consiga fazer isso reduzind o SUas reservas a nớveis muito arriscados. Qual era entóo a situaỗóo do pais no que diz respeito a essa questóo? Ora, em primeiro lugar.
o
o compo rtamen to da balanỗa comercial em 2002 surpree ndera
I

me:iros meses do governo Lula",

Esta seỗóo e: a seguinte reprisarn, de modo resumido , argumen tos do capitulo
seis pri"Brasil D~/jwry : razừes. contradi ỗừes c limites da polỹica econ ụmica nos

o Brasil corno plataform a de valorizaỗõo financeira inrernac ional

-z:~~::,i:r ;aỏ~~:c~op::~:~ance

prúprio governo (de FHC), ultra~ass~ndo em mai~ d~ 50% o valor
esperad o para seu superỏvir. MaIS ainda, a tendờn cia era de uma
par:' ~: performance futura ainda melhor, visto que o ajuste do cõmbio a
do
;.':~ : rir de janeiro de 1999 parecia estar finalmente colocando as contas


J;}

:11A.

>

37

das reservas, a variỏvel con:~.:J/ ereta que deve de fato ser averiguada para se avaliar a questóo da sol;~5'. vờncia externa. mostra um resultado surpreendente: diferencernenre
'~~~t do perớodo entre setembro de 1998 e janeiro de 1999, em que fo~~
d,VIã
~~i drenados para fora do paớs mais de US$ 40 bilhừes, o estoque de
:>1:'-sas de posse do governo central manteve, ao longo de 2002, um com:~(~ ponam ento absolut amente esróve!',
Nóo que nóo existissem problemas pelo lado das contas externas.
: ;'~:~~.'ãExjstiam e continu am a existir. Mas sóo de natureza estrutural (au~:fift mento da dependờncia de importados, elevaỗóo do passivo externo
com
ã~lDt.Jlqujdo por conta da inrernacionalizaỗóo do capital produti vo
longe.
:':~;;-con seqỹent e elevaỗóo perman ente das despesas em dúlar etc.),
~to ao
~~~j~~portanto, do agrava mento conjun tural que serviu de argume
viesse a
'}i;&;~~Ovo governo. E, mesmo que esse agravamento conjun tural
cusro para a
.:::ã;;:.-~t;'~correr, o acordo com o FMl, com todo o seu pesado
~*~~4~ci edade, jỏ estava fechado (fora assinado em agosto), permiti ndo que
. ,
~TIớ..lfalquer tempestade inesperada fosse enfrentada.
.:

ar a
~ e::~::.;.,~~Iffi A outra razóo amiỳde levantada pelas autoridades para Justific
i~illl~d uỗóo que de inớcio deram polớtica eco~ụmica era ~ risco -: p~ra
iminen te - de um descontrole monetỏrio. Nessas circunstancias,
'-' - ,~ .

~liỏs. de~;n~es~rada ~esvaloriI:lỗóo

.

E i'~~~,$ava-se , deviam ser tomadas as medidas necessỏrias, fossem elas quais

~.;~~t;e
_.. "", I.es
rl "-;:.-.

t~~1~~~i

li~~1:f~i;f~~pecificam e:nte
go
:~~{.
~./Đ

l:/~
t ........
!~j

iJ.:.

~.


~;
.~,....
"',;:.

a
com relaỗóo a essa questóo.
ldg
real jogava a favor. VISIO que. do ponco de vista ao comercio exrenor, hỏ um
s que
de trờs a seis meses) entre a oscilaỗóo sỹbira do pre:ỗo da divisa e .os_ resultado
- c
. _
.
~a se podem colher.
:. comeỗam o ano em USS 36 bilh~es (a n;ộdia J~ 200\ fOIYS$ 36.3 bllhocs~.
40 bi~ lam para US$ 33 bilhừes em abril e rnaio, alcanỗam a faIxa dos USS
e: setembr o
~ừes em junho e: julho. ficam na esfera dos USS 38 bilhừes em agosto
37.8 bi'hừc~.
"' ~e US5 36 bilhừes no bimestre: seguinte , fechando o ano em USS
a s:mgTl:l
nỳmeros f:llam por si: n30 tinha havido nem estava havendo nenhum
o real
tada, nada que: pudesse: se assemelh ar :I um ataque especula tivo contra
ocorrera
, tanre do brutal enfraque cimento da posiỗóo externa do paớs (como
.," sctembro de: I 'J'J8 e: janeiro de I 'J'J'J).
~~ .


~.

"

li
:ãJ.?ã
'~

~

~l

:tt.'~'I


38 • Brasil Dt/ivtTy

fossem, para reduzir o ímpeto desse processo. Proceder de outra forma
seria como assinar logo de cara um atestado de incomp etência e coma
promet er a viabilidade da gestão que se iniciava. Justificava-se por aí
manute nção da elevada taxa real de juros e o estrang ulamen to da
liquidez da econom ia (o aumen to do compu lsório dos bancos, em
fevereiro, retirou da economia, de uma hora para a outra, cerca de
10% de seus meios de pagame nto).
Mas qual era a principal razão desse compo rtamen to adverso dos
índices de preços? O principal problem a era a própria desvalorização
do real a partir de julho de 2002, provocada pelo tumult o eleitoral.
Com a defasagem que sempre existe nesses casos, os índices de preços
o/
começaram a demon strar o impact o do choque a partir de outubr

novembro. Masa assincronia existente no processo de reajuste de pre·
ços e o peso que neles têm as tarifas públicas e os chamad os preços
administrados (combustível, gás erc.) tornava m impossível que todo
ele fosse absorvido de uma só vez. Assim, com ou sem polfrica monetária conrracionista, os índices de preços continu ariam a subir até que
todo o choque tivesse sido incorpo rado, passando a declina r a partir
daí, empurr ados também pelo declíni o do câmbio (que foi exatam ente
a trajetória por eles descrita). Nenhu m descon trole inflacionário à visde
ta, portant o. E como ele poderia existir com a econom ia andand o
lado, pratica mente estagnada há tanto tempo? Tampo uco existiam
como continu am a não existir - na econom ia brasileira mecanismos
capazes de começar por aí a girar a roda da inflação inercial, como
ue
sugeriu inadver tidame nte o preside nte do Banco Centra l, Henriq
Meirelles, em agosto de 2003.
Portant o. a tese do precipício ainda está por ser demon strada. Os
a
dados existentes sobre reservas e um mínimo de conhec imento sobre
formação e o compo rtamen to dos índices de preços não nos aurorizam a confirm ar sua verdade . O govern o alega também que tinham
ásido cortadas as linhas de crédito para o país e que era preciso recuper
las rapidam ente. Mas, até hoje. não mostro u quais foram esses financia
mentos e em quanto foram cortado s.

2. A falácia do estágio de curto prazo na ortodo xia
Fizemos o retrospecto desses elemen tos porque a justificativa go'
vernam ental para tamanh o grau de ortodo xia passou sempre pe1:l
afirmação da necessária recuper ação da "credibilidade" . Seria preciso

I:

-\',


. j~~: .

!rl -

};?'Mas

'': .'Ó=

r
'1%

)t:;:-

;:1;2

}{K:i1''.

H\ih.. ",.

h

• 39
O Brasil como plataforma de valorizaç ão financeira internacional

o ajuste
...• recuperá-ia para não compro meter as contas externas, pois
·i;·· efetivo do balanço de pagame ntos do país ainda estava em curso. O
idaBdc edra justame~t: a dqueda ddo
creddibilC

.~._,__: :__.-~": ~:'";: ' sinal da recuPleração ddessa
a
risco-país, a e evação o preço o - 00 e a apreClaçao a rnoe
.
drastic amente os
::; ~ domést ica. Para conseg uir isso era preciso reduzir
remédios da
~"'~" , índices de inflação e fazer uma sólida profissão de fé nos
::~i-: contraçâo da liquides e da restrição monetá ria e fiscal. Em poucas
ica", e ela foi
.~;::.- : palavras. era preciso "beijar a cruz" da ortodox ia econôm
'_:_:_: ' beijada com devoção.
Mas esse discurso, de que o novo governo usou e abusou ame o
::{.
da
enorme espanto gerado pelas medidas com que iniciava sua gestão
econom ia, tinha um lado dúbio, pois sugeria que, uma vez recuperada
f~;:--- a "credibilidade", uma vez feita a dolorosa travessia , chegaria finalmente a hora de colocar a retoma da do desenv olvime nto como o obje;::f~::l tivo prioritário da política econômica. O estágio na política ortodox a
~ Qg>'era, sugeria -se. de curto prazo, necessário para viabilizar a transição
\ -..- : :
!. -,~ ->~:" sem trauma s.
Quem conhecia, porém, a forma de funcion amento do modelo
ão era
.2~~}1econôm ico abraçad o pelo governo do PT sabia que tal suposiç
per~r-i~ihnais uma falácia. A "lógica da credibilidade" simple smente não
~~~&iite tal mudan ça de rumo. Esse tipo de credibilidade só se mantém se
~scal impla;_- :;~lg$rmane cerem inalteráveis na p,o~í[ica econ?~ica o aju~te
iorusta ,etc. Der; :~~i ii1.~;;1~vel, o juro real elevado. a política moneta na contrac
sentido con:;:~~}~~P9is que se entra nesse j~go, qualqu er movim entação no
d

I, .. ~ ''lH' "'-'
junto com
~;J?,i~.; ~io leva de roldão a "conquista" tão durame nte obri a e,
K;~~~~j.S1~ as supostas c?ndiçõ es de "estabilida~e" necessárias para o crescili::-}Ei •. , ':fl1~nto. Poder-se-Ia então supor que o nudeo duro do novo governo
fª~ se deu coora dessa impossibilidade e julgou que seria capaz de
t:~:i1f~j~r inicialmente o "jogo do adversário" para obter, a partir daí, as conI;_ ~;~~~~es necessárias para implem entar sua própria política econômica,
P;'~'.:.;:f~~~ela que recuperaria o crescimento e geraria os 10 milhões d.e emprocesso eleitoral.
mesmo essa hipótes e parece hoje difícil de ser conside rada.

..

L-0/ F:.'-" . l~s promet idos pelo candid ato Lula ao longo do

Õ

da dizer que é preciso erguer uma estátua a Pedro Malan (mi-

~â?ois de ouvirm os o secretário de Política Econôm ica do Ministé rio

.1'
', .

,
~J'II

:~il

1:.,

-'rI)1



40 • Brasil DtJiv"J'

nisrro da Fazenda ao longo dos oito anos de governo de FHC), depois
de assistir ao ministr o da Fazenda, respon dendo às acusações de
continuísmo, dizer, na presença de FHC, que "sendo igual, mas correra, ele continu aria a praticar a mesma política econômica por mais dez.
anos", fica difícil imaginar que o continu ísmo foi obra de algum movimenro tático. A única hipótese que sobra é que houve uma escolha
deliberada por esse tipo de modelo. com plena e total consciência dos
responsáveis por ela. Mesmo calçados em 55 milhões de votos e rnonrados num capital político inédito na história do país, os novos donos
do poder não quiseram arriscar um milíme tro e se decidiram pela linha de menor resistência. Escolheram o caminho "mais seguro", que não
afrontava interesses constituídos, incemos e externos, que impunh a de
o
vez o rentisrno como marca de nossa economia, que consagrava para
Estado o papel paternalista e "focado " de "cuidar dos pobres", que não
,
questionava as disparidades regionais e pessoais de renda e riqueza
que não ameaçava sequer arranha r a iníqua estrutura patrimonial do
país, que o mantin ha, enfim, submisso aos imperativos da acumulação
financeira que domina a cena mundia l do capitalismo desde meados
dos anos 1970.
3. A verdad e do model o escolh ido
Em meados de 1996. Gustavo Franco, então diretor da área exrerna do Banco Centra l (e, pouco depois, seu presidente), escreveu um
artigo, que circulou muito entre os economistas, denom inado "Inserção externa e desenvolvimento", sobre o qual o presidente FHC disse
tratar-se da "revolução copernicana na economia". Embala da no idolatrado invólucro da formalização, não passava de uma apologia das
prescrições do Consenso de Washingcon, que o governo de Fernan do
Henriq ue já estava utilizando no país, quais sejam: redução do tamanho do Estado (privarização), abertur a comercial, políticas monetá ria
e fiscal rígidas, raxas reais de juros elevadas. Alegava Gustavo Franco
que, mistura ndo bem tudo isso, depois de certo tempo o país estaria
preparado para pegar o bonde da história. O choque de concorrência

implementado pela abertura promoveria um processo de reestruturação
produtiva que nos faria ganhar um lugar no admirável mundo novo
globalizado e garantiria as condições para o crescimento com estabili
dade. O Estado mínimo e as polüicas fiscais e monetárias "sólidas"
Com juros reais elevados, além de constit uírem antídot os naturai s con-

~f

~~~

~ .

fi

~~

:-l'i

I

"fili.

~~

I

o Brasil como plataforma de valorização financeira inrernacioncl

• 41


s
tra a inflação, assegurariam a credibilidade dos investidores externo
,~=~
e resolveriam os problemas do balanço de pagamentos. 'Para completar
f;'tIreceita, a reestruturação produti va fària elevar os salários graças ao
a
aumen to na produtividade. constit uindo assim instrum ento inestimável para a redução das desigualdades distributivas.
Uma década depois de aplicadas . essas medidas geraram estagna-. ção econômica, desemprego recorde, enorme aumen to da vulnerabilidade externa, o retorno do país à posição de econom ia primárioexporta dora e a perman ência do mesmo padrão distribu tivo, com
e
inevitável crescimento da pobreza absoluta. da violência e da barbãri
nos grandes centros urbanos do país. Pouco tempo ames do surgimento
do texto de Gusravo Franco, a diretoria por ele coman dada no Banco
Centra l tratava de tomar as medidas necessárias para garanti r a inserção que de fato import ava: a admissão do Brasil no circuito internacional de valorização financeira. A renegociação da dívida externa, bem
como sua securitização, e a criação dos títulos da dívida brasileira cotados em mercados internacionais já tinham se encarregado de pane
das tarefas. Simult aneame nte, a mesma diretoria se encarregava, na
surdina, de outra parte, também fundamental: a desregu lament ação
do mercado financeiro.
Utilizando um expediente criado por uma lei de 1962 - as chamadas contas CCS, contas exclusivas para não-residentes, que permitem
'''J~~'' ''
;·~:·}{5~
livre disposição de recursos em divisas -, o Banco Centra l promoveu
1~g~~~:tr a
l,ff{PRd: a abertura financeira do país. Operaram-se duas grandes mudanças .
')~*.~~i Em primeiro lugar, alargou-se o conceito de "não-residente", incluinem
~~it do-se aí não apenas as pessoas físicas ou jurídicas que estivessem
finan:~;_~;~~1i.· trânsito pelo país, mas também as comas livres de instituições
~:~~i~~ ceiras do exterior (instituições financeiras estrangeiras não autorizadas
remeter
~~.:~;.a funcionar no país)". Além disso, as CCS passaram a poder
ica

~j~~~i;~ livremente para o exterior não apenas os saldos em moeda domést
nâo-resi;~:~:,?~;resul rantes da conversão da moeda estrangeira com a qual os

na gestão de
Na realidade. essa primeira. mudança foi impleme ntada j:i em 1992.
como diretor
Francisco Gros como presiden te do Banco Central e Arrnlnio Fraga
novembr o de
da área externa, mas o mercado permane ceu incrédul o até que. em
foi
1993. já na gestão de Gustavo Franco na área externa do Banco Central.
que eles estavam
_.. publicad a uma "cartilha" que escancar ou para os agentes aquilo
no mercado como
.-:' vendo sem acreditar. Não por acaso, tal cartilha ficou conhecid a
;. "Cartilh a da sacanagem cambiar .

.- ...

~~.,

~,

).i..
..:'"
.r .'
, ..
'., :;1
. .) ,


. "~

'·.1 :

I

:. 1,

·~ I

.J '

,

: ',

-r

' ~' . ,


42 • Brasil J)tlivtry

dentes ti....essem entrado no país, mas todos e quaisqu er saldos- Abriude
se com isso a possibilidade de qualqu er agente, indepe ndente mente
ser ou não residente, enviar sem restrições recursos ao exterior. basrando. para tanta. deposit ar moeda domést ica na conta de uma institui
ção financeira não-residenre",
Essas mudanças produz iram a forma e a substân cia da inserção do
Brasil nas finanças de mercad o internacionalizadas. Os títulos da dívino
da brasileira lançados e cotados no exterior confirm aram o país

finan.•papel de emissor de capital fictício, que viabiliza a valorização
do
ceira e garante a posteriori a transferência de parcelas da renda real e
capital real para a esfera financeira. A liberalização financeira vem ~~ ranrir o livre trânsito dos capitais interna cionais , que podem assim
de
maxim izar o aprove itamen to das políticas monetá rias restritivas e
o,
juros reais elevados. Sem o destrav amento do mercad o, por exempl
os mais de US$ 40 bilhões que saíram do país entre setemb ro de 1998
e janeiro de 1999, atemor izados com a iminen te desvalo rização
do real, não teriam podido fazê-lo e teriam amarga do duras perdas.
Mas o traje desse novo papel do país não estava comple to, Por mais
que tenha tentado , FHC não conseg uiu implem entar, na questão pre~
se
videnciária, todas as mudanç as para que sua conform ação se adaptas
ao novo figurino.
A reforma da Previdência foi justam ente o primeir o projeto de fôlego em que se empen hou o governo Lula. Logo nos primeir os meses
de gestão, o novo govern o manda ao Congre sso um projeto de lei que
o
propõe várias aiteraçôe s nessa área, mas que afeta fundam entalm en te
funcionalismo público , já que, no setor privado . a reform a fora im•

haAs procuradoras da República Valqulría Nunes e Raquel Branqui nho encamin
em que peram 111 Justiça Federal. em dezembr o de 2003. uma peça de acusação
dema condenação. por crime de improbid ade administrativa. de quinze executivos
essa transligados ao Banco Central e ao Banco do Brasil. Elas argumen tam que
não pode ser
formação das CC5 foi (c:iGl de modo irregular, pois uma lei feder..u
OUtras paregulamentada por um órgão de hierarqu ia constituc ional inferior. Em
foi fdra

Iav~, o Congresso teria de ser ouvido sobre isso. e não foi. A mudança
carta circusingelamente, mediante uma "carta circular- do Banco Central. Uma
er" norma.' c
lar é um documen to que tem o papel exclusivo e resrriro de "esclarec
a esse respeiregulamentos editados pelo Conselh o Monetár io Naciona l. (Veja-se,
matéria de Raimund o Rodrigues Pereira, "Urna manipulação extraordin~riaM. publicad a na revista &portagtm. n, 53. fcv. 2004.)

to.;l excelente

_

01-..."' '''

~ \.

o Brasil como plataforma de valorização

financeira lnrernac ional • 43

plantad a pelo govern o anterior. Seu sentido básico foi alterar o funcio.
namen to do sistema previde nciário dessa faixa de trabalh adores
o
Pretext ando déficits insustentáveis e que se agravariam com o tempo,
governo propôs mudan ças no sistema de previdência do funcionalismo que, concret amente , implica m a transição para um regime de "capitalização", em substitu ição ao regime de "repart ição simples" até então
avigente. A exemplo do que FHC fizera com a previdência dos trabalh
to
dores do setor privado da econom ia, o principal instrum ento propOS
ios,
para operar essa mudan ça foi a imposi ção de tetos para os benefíc
tetos que obrigar ão os servidores a particip ar de fundos comple mentadisres de previdência. Mas, diferen tement e de FHC, que não ousou

PT
pensar as "regras de transição", a propos ta origina l do govern o do
das
foi ao parlam ento sem elas, cabend o aos congressistas a introdu ção
mudan ças que tornara m "menos radical" a reform a proposta",
Assim, tendo o Fome Zero como a principal estratégia de marketing,
mas sem conferi r efetiva mente a essa meta grande import ância nem
lhe propor cionar recursos subsranrivos", o govern o esforçou-se mesmo, logo de início, foi para comple tar as mudan ças iniciadas por FHC
que
na área previdenciária. Que o govern o tenha começa do por aí,
ão
tenha empen hado todo o seu peso político e seus cargos na aprovaç
dade. Na verdade ,
. y _!."- o.i.: de tal reforma , pode ser tudo, menos uma casuali
F .'"
j §l~·!i:;,~ esse infcio é sinal inequívoco do caminh o escolhido pelo novo govermais plauslvel a
~ . ~~*?: no e da doutrin a por ele abraçad a, (Ornan do ainda
o
h~~:-'Vf' · hipó[es e de que houvç uma escolha conscie nte, e não uma situaçã
ar e
o'} inescap ável que teria empur rado o govern o Lula a confirm
<::
'b.!-1!i" j '" aprofun dar o mesmo modelo.
'-;lW ' ·-xt . .i.r Ao comple tar a transfo rmação idealizada por FHC, màtarar n-sc
0,_, ' '?"~_"';-~
..t ·
final"';v:irios coelhos de uma s ó cajadada. Em primeir o lugar, criou-se
·ment e o grande mercad o de previdê ncia complementar. que havia mais
. ..."


~~. . {~de duas décadas vinha despert ando a cobiça do setor financeiro privado
:

!.

4' ( .

".J.~

ir. Não CUSI3
buiçâo aos inativos - a qual FHC renrara inúmera s vezes sem consegu

Mais uma ousadia (à direita, sempre) do novo governo foi a imposição de contri-

~S}:taciona1 e in rernacional. Cabe ressaltar que, nesse sentido, a viabilização
;~

.

~L

:;.'r

program a

s foi a
~~~. lembrar que o ~tor b:isico do insucesso de FHC em todas essas Tentativa
~~, oposição feroz feit2 justamen te pelo Partido dos Trabalhadores.

; : de caridade do que propriam ente a feição de uma polírica de Estado.


:->'5, Não por acaso, o Fome Zero tem muito mais a feição filamrópic
:.......~..

';.;

o •.
..:j;.*"~


44 • Brasil Dflivery

da reforma no setor público representa a abertura de perspectivas de
acumulação que não estão presentes quando se considera o mercado
previdenciário oriund o do setor privado da economia. Apesar de substantivamente maior do que o número de trabalhadores do setor público, o mercado consrirufdo pelos empregados do setor privado possui
a
renda média menor e enfrenta a ameaça do desemprego. A abertur
desse novo c suculento espaço de valorização foi, portant o, o primeiro
a
dos grandes tenros (à direita. sempre) marcados pelo novo governo com
uições. da
~ aprovação da reforma. Além disso, com a elevação das contrib
idade e do tempo de trabalho para a obtenção do benefício, bem como
no
~ com a taxação dos inativos . o govern o contou pontOS também
intocável objetivo do "ajuste fiscal". Pôde, ainda. por meio de um bem
pensado programa de defesa publicitária dessa iniciativa. colocar os
funcionários públicos como os grandes vilões do descalabro social do
pais? e vender a idéia de que o intuito da reforma era simplesmente o

de fazer "justiça social". E.last but not least, um sistema previdenciário
com predom ínio do regime de repartição e sob o monop ólio do Esta,
do era algo que não combinava em nada com um país que buscava
desde o início da década de 1990, afirmar-se como um das plataformas mundiais da valorização Iinancelra. A reforma patrocinada pelo
PT veio contrib uir de forma decisiva para o alcance desse objetivo.
Ocorre que o regime de capitalização é por definição "renrista" (interessam-lhe juros reais elevados e ativos fixos, de preferência papéis
o
públicos, já que seus gestores têm de "garantir", no longo prazo,
retomo individual das contribuições nos valores contratados), enquan to
o regime de repartição é "produtivisra" (interessam-lhe emprego, renda e capital produtivo, visto que quem trabalha "paga" a renda de quem
não trabalha). Sendo assim, essa transformação, além de, em muitos
casos, ter violado direitos adquiridos, gerou mais um import ante elemento para tornar mais profun das as crises experimentadas pelo país'".
Mas isso certamente passou por detalhe na cúpula governamental, diante da "modernização" institucional do capitalismo brasileiro trazida pela
,
ro

de Fernand o
Recuperando. sintomat icamente . uma das bandeiras de campanh a
Collor.
a maré é favoPior do que pré-c íclico, o regime de: caplralizaçâo é neutro quando
a economi a
rável, mas joga complet amente contra quando os ventos empurra m
dos ativos
ladeira abaixo, E isso é tanto mais verdadeiro quanto maior for o peso
carregados pelos fundos de pensão.

o Brasil como plat aform a de valorização financeira

internaci onal' 45


S.P",tlo.
A expressão, felicfssima, é de João Sayad (cf "Taxa de juros", Falha dI'
24(412000).

âo de
Uma das conseq üências benéficas muitas vezes aventada para a msrauraç
da "taxa de
regimes de capitalização é que eles. em geral. forçam uma elevação
em econopoupança" da economi a, o que seria um efeito salutar, particula rmente
s de poumias como as nossas. que, segundo o discurso convenc ional, são "carente
mesmo
pança", Organizadas dessa forma, porém, as finanças não se prestam nem
para a conform ação do círculo virtuoso defendid o pelo mainstream econômi co
va que
(poupan ça-inves timento- renda). visto que a poupanç a financeira substanti
de garantir
a sociedade acaba por gerar não se objetiva em invesrim entos capazes
torna -se um
no futuro um fluxo aumenta do de bens e serviços. Ao contrário , ela
renda sem a
element o adiciona l a pression ar a economia para a geração de
intermed iação da produção material.

°

reforma. além dos inegáveis "ganhos de credibilidade" que ela angariou 11. Não é demais lembra r que, em troca de seu apoio é do financia
mento a projetos sociais, o Banco Mundi al "sugeriu" ao novo governo,
a
ainda antes de sua posse, que ele justam ente concluísse a reform
previdenciária (além de realizar a reforma tributá ria e a universitária).

Conclu ída, ponam o, essa etapa, fica quase pronto o país para intcgrar, trajado a rigor, o circuito interna cional da valorizaçâo financeira.
a
Mais alguns detalhes. como a aprovação da nova Lei de Falências e
autono mia do Banco Centrai, expedientes vistos como necessários para
garanti r a "renda mínima do capital "!', e nada mais faltará. E esse

momen to glorioso não tardará a chegar, visto que o governo Lula
tomou todas as providências para que mais essas reformas rnodernizantes sejam implementadas o quamo antes. A toilette estará então
completa. A autono mia do Banco Centra l faz ver aos "mercados", de
uma vez por todas. que o Estado brasileiro não abrirá mão de seu
papel de perman enteme nte retirar, pela via dos tributos, parcelas da
renda real da sociedade a fim de transferi-Ias para a esfera da valoriza
)
ção finance ira", assegurando rendim ento do capital ficncio (rítulos
que produz": Ao mesmo tempo, esse Estado transforma a moeda do
país em objeto de tráfico e de agenciamento, sujeitando-a a operações
de arbitragem que farão seu valor flutuar ao sabor dos interesses e das
aplicações de cada momen to. Ora como objeto de especulação. ora

11

;~

~' Il
izaçâa
";.j.'> Ver sobre essa questão François Chesnais, " Int rodução geral", em A mundial
tj: ~~ fi nat1ctira: gintl<', CUltO! .. roca! (São Paulo. Xamã, 1998) .
e•
real
.

.;lt , Pod
er-se-ia argumen tar que o eleito riqueza produzid o pela garantia de renda
~~::.•
e o inves_:;" que a maquina ria financeira gera teria o papel de incentiva r o consumo
"
; 'lo,

{ ,-

-i;~l


como pretexto para a manutenção de desmesuradas taxas reais de juros, a moeda doméstica põe-se sempre como um caminh o promissor
para a obtenção de excepcionais ganhos em moeda fone. A abertur a
financeira garante a efetividade desses ganhos, concedendo a seus ativos de origem a liberdade necessária para maximizar, em dólar, sua
estada no pais. Os fundos de pensão (que serão agora ainda mais numerosos e volumosos) funcionam como braço auxiliar da dívida pública, no papel de retirar da esfera da acumulação produtiva parcelas
substantivas de renda real que poderiam, de outro modo, transformar-se
em capital produtivo. Farão assim, indireta mente, pela via voluntária
d,s contribuições previdenciárias. aquilo que o Estado faz diretam ente
pela via imposiriva dos tributos.
O governo do maior partido de esquerda (!?) do mundo . no maior
pais da América Latina, terá então prestado aos interesses do capital
rentista e a seu ideário um serviço inestimável. Terá demon strado de
modo irretorquível a {esc de que não há ourra alternativa, de que não
há outro caminh o, pois que ninguém duvida das intenções progressisras do Partido dos Trabalhadores e de seu mais import ante líder. Estará
ao mesmo tempo desemp enhand o papel de inegável import ância na
consolidação do sistema monetário internacional vigente, no qual uma
• moeda purame nte fiduciária funciona como "lastro" da arquite tura
financeira mundia l. A manutenção desse sistema, porém, é precisamente o que mantém a dominâ ncia financeira da valorização!", pois
que o emissor do lastro internacional, ao expand ir livreme nte sua

moeda. gera uma plerora de capitais que se defendem, por meio da

II

retira
timenro, devolvendo à esferada acumulação produtiva com uma mão o que
caso do
dela COm a outra. Ainda que isso possaeventualmente ser verdadeiro no
ndo sob
consumo, no caso do investimento é urna esperança vã, já que, continua
os imperativosdo gasto público minguado e do juro real desmesurado, as expectativasderivadas de aplicações produtivas permanecerão deprimidas.
o do
~Dominancia financeira da valorização" afigura-se um termo mais adequad
a
que "dominância da valorização financeira". pois enquanto o último refere-se
se
momemos ou f.1Ses na história do capitalismo em que a valorização renrisra
no lonClt:l.ccrba e se sobrepõe !l. valorização produtiva de um modo insustentável
imporgo praeo,o primeiro diz respeito !l. etapa correnre do capitalismo, na qual a
peculiar
til.nda e a dimensão dos capitaise da valorizaçâo financeira, combinados 11.
valoformaassumida pelo sistema monetário Internacional, fazem que a lógicada
modo
rização financeira contamine também a esfera produtiva, gerando um novo
s operade regulação adequado ao regime de acumulação financeira. As mudança

o Brasilcomo plataforma de valorização financeira internacional.

valorização financeira, de crises clássicas que poderiam reduzi-los a pó.
e

Se, por um lado, o papel dos Estados nacionais e dos fundos mútuos
de pensão como instrum entos de extração de renda real para a alimentação do capital financeiro cigano minora a dimens ão fictícia desses
capitais, por outro vai acirrando as contradições inerentes a um sistema que vê diminu ir o capital produti vo (que gera renda real) enquan
e incha
to engord a o capital financeiro (que extrai renda real do sistema
ficticiamente nos mercados secundários, exigindo ainda mais renda),
É esse enfim o modelo adotad o por Lula e pelo governo do Partido
dos Trabalhadores para promov er o desenvolvimento do Brasil. A retórica convencional continu a garanti ndo que é a persistência na polío
tica da austeridade fiscal com contração monetá ria o único caminh
seguro, certo e "científico" para se alcançar o "crescimento com estabilidade". Com esse tamanh o de dívida, alegam, o pais precisa "economizar" para reduzir seu peso com relação ao PIa e ter permissão para
voltar a crescer. Nunca se lembra m de dizer que o crescimento da divia
da, que a fez ganhar a dimens ão atual. não foi resultado de nenhum
"irresponsável" gásrança governamental, mas da própria receita ortol
doxa que prescreveu juros elevados para Sustentar a apreciação cambia
que vigorou de 1995 a 1999. Nunca se lembra m também de dizer que
o pagamento desses juros tão polpudos é o grande responsável pelos
déficirs nominais que fazem crescer cada vez mais a própria dívida
pública, mesmo com os serviços públicos esfolados e com o desemprego em níveis insupor táveis.
Finalmente, esquecem ainda de dizer que a dívida não é para deixar
de existir, não é uma anomalia, um pecado que o país tem de purgar
para ganhar a recompensa do crescimento. Ao contrár io, ela faz parte,
. como sempre fez. do capitalismo. Ela deriva das relações entre Estado

", por
das pelo royotismo vão nessadireção. A chamada ~flexibiJização do trabalho
da força
exemplo, permite, entre outros: utilizar mais imensamente o valor de uso
próprio
de trabalho; repartir com o trabalho os riscos do capital, flexibilizando o
o custo

capiral;em conjunto com a custornizaçâo da produção, reduzir ao mCnimo
(que se
de carregamento de estoques de matérias-primas e bens imermedi~rios
itivas e
torna um desperdfcio irnperdoãvel num contexto de taxasde juros reaispos
deve
elevadas), Todas essas mudanças têm que ver com o contexto no qual hoje
zisra da
se dar a valorização produtiva, qual seja: o contexto rentisra e curto-pra
o no
.'.• valorização financeira. Ver a esse respeito Andrés V. Fronrana, O capitalism
skulo XX (Tese de Doutorado em Economia. Universidade de São Paulo.
~.:Institu ro de Pesquisas Econômicas, 2000).
1. fim tÚJ
='

47


J
I

I

1

I




:;1

'.

e dinh eiro , e se, noutros tempos,
e acumulação privada, entre pod er
ntia do "salário social", cheganserviu como braço auxiliar para a gara
a de trabalho e criando o espaço do
do a desfetichizar a mercadoria forç
do valor e do capital, imp edin do a
antivalor l6 , hoje ela afirma o espaço
ndo-lhe uma renda mínima.
queima de capital excedente e assegura
mai or a responsabilidade do
A últi ma observação torn a aind a
idad e do desastre brasileiro, que
governo Lula por patrocinar a con tinu
con trár io do que pode parecer à
já dura mais de duas décadas. Ao
tal pro duti vo e capital financeiro
primeira vista, o "conflito" entre capi
gado, no qual fica evidente a irrasó aparece com vigor no plano agre
ento eco nôm ico na extração de
cionalidade de asse ntar o cres cim
ção. No plano dos capitais inrenda real, mais do que em sua gera
qua ndo se trat a do grande capital
dividuais, porém, particularmente
arena mun dial , com bina r gan hos
internacionalizado que opera na
pró prio da lógica de seu funciorenrisras com ganhos produtivos é

nen hum outr o objetivo que não
namenro, que é míope e não enxerga
ho monetário. Logo, se o rnornenseja a expansão ampliada de seu gan
pelos Estados nacionais da periro é de juro real elevado patrocinado
cion ame nto da produção a essa
feria do capitalismo, ajusta-se o fun
imize monetariamente a com bicircunstância, de modo que se max
ho financeiro, Assim, mais do que
nação entre ganho produtivo e gan
seus negócios, as críticas em unísum problema efetivo enfrentado por
grande capital entoam con tra os
sono que os empresários ligados ao
de cena de quem tem a obrigação
juros elevados fazem parte do jogo
os milhões de desempregados . As
política de se dizer preocupado com
pro duti vo e financeiro, de um lado,
relações que ligam o grande capital
de capital fict kio, de OUtro, mose o Estado na posição de emissor
o não existe, a não ser para os
tram, no enta nto, que esse incô mod
quin s e os proprietários de fabrimicroempresários, os donos de bote
ados à "economia de mercado" c
queras de fun do de quintal, conden
palavras, as lógicas pro duti va e
à geração de renda realI? Em outr as
gado, conflituosas, não os capitais
fictício-financeira é que são, no agre
que delas se beneficiam.
Chic o de Oliv eira. Veja a esse

mo a lese bast ante conh ecid a de:
16 Tomo de emp résti
erda).
is. Vozes, 1998, Coleção Zero à Esqu
respeito OI direitos do antlualor (Petrópol
cará ter de
do
del
c: insp irada em Fern and Brau
I ~ A lemb ranç a - muit o a prop ósito
ativo é de:
utiv o e capi tal finan ceiro -esp ecul
ficção do conf liro entre capi tal prod

o Brasil com o plata form a de valorização finalKcira i

s do que nunca de uma
Ora, tudo isso indica que se trata mai
por essa "sociedade natural"
lha do Estado a direção a ser seguida
r do lado da ali(mação do renrisrno;
de tem com o capital. Ele ode ·o
al, mas a solu tam ente familiar e '\ ,
que é perverso do ponco de vista soci
ulação rivada, ou pod e afro ntar
benéfico do POnto de vistpara extrair renda re essa lógica e utilizar ~eu pod er, não
tais , mas para obrigá~los à acurnue engordar financeiramente os capi
a real.A insistência do establishment

I~áo produtiva e à expansão da rend
da austeridade, defendido como
econômico do governo no cam inho
ento" - leia-se, crescimento da
receita cen a e segura para o "crescim
e da renda real -, expressa, ao conpro duç ão c, por tant o, do emprego
assegurar ao capital, via pagamento
trário, a necessidade do Estado de
que
posteriori" dos ativos fictícios
.
de juros reais positivos, o "lastro 11
• 18 O
gem de afro ntar os interesses consem ite. governo do PT, sem cora
para arriscar uma mud anç a na posriruldos, sem nen hum a disposição
capaz de enf ren tar os pro blem as
tura do Esta do que o (Ornasse
a reafirmação da lógica perversa
experimentados pelo país, escolheu
rota! do Brasil às exigências da acuque já estava em curso e a entrega
mos que resultados de obteve em
mulação privada. Feita a escolha, veja
seu primeiro ano de gestão.

4. A verdade dos resulrados

Clau dia Antu nes,
ãrio inrer naci oexro atua l de um siste ma mon er
Cum pre acre scen tar que. no conr
tes e os juros

d ívidas públ icas dos países eme rgen
nal flduc iãrio , :I secu ruiza ção das
bio flucâm
o os ganh os de arbil rage m que o
positivos que das paga m, bem com
dom ésriença de força entre as diversas mo edas
tuan te prop orcio na graças à difer
al financeiro
para gara ntir o rend imen to do capit
cas, s50 acessórios impr escin d íveis
a forn ecer
próp rias raz ões, não está disp osto
quan do o país hegern ônico, por suas
'
essa garancia.
dos maiores
das são da Folha ik S.Paulo. um
Toda s as man chet es aqui repro duzi
as entre jane iro e maio de 2004 .
jorna is do pafs, c furam publ icad

FoUJa tk SPau!«, 9/512004).

conc edid a a
lta socia l' será cresc ente ", entre vista
jos é LuCs Flori (MPar3 Fior i, 'revo

primeiro ano do governo Lula,
A part ir do início de 200 4, findo o
eçam a estampar as man che tes" :

estatísticas fechando, os jornais com
s em 200 3";
"Brasileiro com pra menos alimento
há dez anos, fica estagnado
"Co nsu mo doméstico, que crescia
em 2003";

9

\.

~

I'

, P

."

.'' jll

]1

.'..)I

-


"Com Lula, renda cai e desemprego cresce";
"Indúst ria tem o pior desemp enho desde 1999";

"Tora! de subocu pados cresce 42,5% em 2003";
"Econo mia encolhe no primeir o ano de Lula";
"PIB tem a primeira queda desde 92";
"Consu mo de famílias tem queda recorde";
" vestime nta sobe em ritmo de conta-g otas":
"Gasto social não a~menta com Lula"; -........
"Desemprego em ão au o vo ta a neve recorde";
"Região Metrop olitana de São Paulo tem 2 milhões de

50 • Brasil Dtlillc'l

,.
desern pregados".
Por outro lado:
"Apeno fiscal supera meta com o FMI";
"Gasto com juros é recorde";
"Brasil é o 4s' colocado em gasto com juros";
"Brasil tem juros mais altos entre os emergentes";
"Carga tributária aumen ta na gestão Lula";
"Lula fãz maior aperto fiscal da história":
"País investe pouco e tem aperto fiscal recorde" .
Apesar disso:
"País ainda é vulnerável, diz FMI";
"Investimento externo direto é o menor desde 1995";
"Superávit não paga nem metade dos encargos da divida do
país";
"Risco-país volta a ficar acima de 500 pontos";
"Stand ard & Poor's vê vulnerabilidade no Brasil";
"Brasil sofre com temor de juros maior nos Estados Unidos";
"JP Morgan rebaixa Brasil e risco-pais sobe";

"Risco-Brasil tem a maior alta em 17 meses";
"Econo mia brasileira segue frágil. diz. BIO".

Em compensação:
"Instituições financeiras obtêm resultado 6.7% maior em
2003";
"Sete maiores bancos lucram R$ 13,4 bilhões";
"Tarifas bancárias sobem mais que inflação";
"Spread brasileiro é o maior do mundo ";

~~~ '

,
~. i''!

~\;~­

*"lt
-.-, ...:-:-;·ú~i:.~:

fl{
~~i

~~i;rtf:.

I
.~

~


o Brasil como plataforma de valorização

financeira internac ional •

"Invest idor ganhou com ortodox ia do PT" j
"Tesouro cede, resgata rüulos e ajuda fundos" .

Portant o:
"Palocci anunci a que ajuste fiscal vai continu ar neste e nos
próxim os anos";
"Polític a monetá ria não muda, diz Palocci":

"Política econôm ica não mudará . diz Lula",

"Presid ente do BC descarta mudan ça de rumo";
"Juro atual não barra expansão, diz. BC";

Não é à toa. então, que, em apenas um ano de governo Lula, já se
cogitem outras formas de luta e mobilização da esquerda: novo partido (que alguns querem apenas parlamentarista) , federação de movimentes sociais, organização do conrrap oder popular. difusão de núcleos
de reflexão e ação socialista etc.

>I

:l

,

.J



,:.
~~.:'=~
;:-... .

.

· -I,
!
.J
J

5':~~;.

~/(.

.~

...:

i1J~..
t~\~~

~~-:i~~.

.~~l.:~~
'-:~ .::"

};~~.~

I

~{~

i ;::"i,;

-!5~4?

I~

~~~io

;il~~

Lula, dezoit o meses depois

SE~'l ESPERAi\ÇA DE SER P:\ÍS

o govern o

A ascensão do Partido dos TrabaJhadores ao governo federal com a
vitória de Lula nas eleições presidenciais de 2002 reacendeu as esperanças de uma refundação da sociedade. A trajetória de resistência do
PT e a história singular de Sua formação, cevada na luta dos trabalhadores nos duros anos da ditadura militar, pareciam credenciá-lo para
- ....~ ...~~ ~ enfrentar a difícil tarefa. Sabemos hoje que essa esperança se frustrou.
~~~~~ Para surpresa geral. o governo Lula não só continuou como aprofundou
:.~ . _~ a política econômica ortodoxa. que prevaleceu no governo FHC.
,~j~~,J Foi tamanho o pasmo que inúmeras hipéreses foram aventadas para
~~{~ explicar a insólita situação: ausência de projeto próprio, "endireitat~~ ';1:mente" progressivo do P'T, ameaça à governabilidade, traição oportu :~j~;nista, medo etc. Uma das hipóteses mais aceitas foi a de que, sem
~
1:~tern ativa no mamem o inicial, dados à freme, o governo Lula faria, só no começo, o "jogo do adversa:F o", para, uma vez recuperada a credibilidade, colocar em prática sua
;:X,çroadeira política I. No enranro, passados um ano e meio do novo


..

ralvez tenha sido a mais equivocada
X~er no, é possível afirmar que 'essa
.

~~~_g-to das as hip6reses 2•

~~q;

t~~~obre a falácia do argurnen to de: que o Brasil estava 11 bei ra do precipício no infcio

."..

·~os por FHC a Lula. ver o primeiro capítulo deste livro , "Brasil Delizwy;

is lc~'~:~e 2003, sem prcjufzo da constatação da gravidade dos problemas estruturarazões
.

diçõcs e limites da polltica econômica nos seis primeiros meses do .gOVCl;JIO
···:~ntra
;Ji.}1la~ .

~.

:,} m do mais, quem conhece minimamente: a "lógica da credibili dade" abraçada
aceirã-ls tempora ria. .0 governo do PT sabe perreitam enre que não <' possível



Tài liệu bạn tìm kiếm đã sẵn sàng tải về

Tải bản đầy đủ ngay
×